Caetano Veloso era um garoto de 6 anos quando, em 1949, um grupo de estivadores soteropolitanos lançou o afoxé Filhos de Gandhy, em homenagem ao lider pacifista indiano Mahatma Gandhi, que foi assassinado no ano anterior. Neste domingo, Caetano, 81 anos, retornou à Praça Castro Alves de tantos carnavais no alto do trio elétrico do Gandhy, como o homenageado do ano e lembrou da mensagem pacifista que surgiu com o afoxé há 75 anos. "O Filhos de Gandhy é uma sílaba da resposta que a Bahia, e o Brasil, têm para oferecer ao mundo contra a guerra", declarou o cantor e compositor.
Visivelmente emocionado e ao lado do amigo Gilberto Gil, embaixador do afoxé e como ele nascido durante a Segunda Guerra Mundial, Caetano aproveitou sua presença na folia para lembrar a escalada de conflitos no planeta e o risco da terceira grande guerra.
Mas no planeta Bahia, é tempo de paz e de reverência ao santo-amarense que em 1973, na volta do exílio em Londres, escreveu a canção Beleza Pura, que diz "dentro daquele turbante do Filhos de Gandhy, é o que há, tudo é chique demais tudo ê muito elegante ".
Gilberto Gil e Caetano Veloso desfilaram nos Filhos de Gandhy |
Beleza Pura
A música foi escrita depois que Gilberto
Gil o convidou a participar de uma mobilização para evitar que o afoxé, em
grande dificuldade financeira, deixasse de desfilar no Carnaval de 1974.
Gilberto Gil, que ontem ao seu lado no trio tocava respeitosamente um agogô, em
sua fala destacou a presença no trio de Benjamin, neto de Caetano e filho de
Tom Veloso. "Ele me disse que estava feliz porque ia sair no Gandhy",
disse Gil sorrindo, ao se referir à fala do menino de 3 anos, que foi batizado
ontem no trio, sob o olhar da vovó Paula Lavigne.
A mulher de Caetano também aproveitou
para fazer imagens com o celular, desde o alto do trio, do enorme tapete branco
na praça, no dia em que seu companheiro era homenageado. O governador Jeronimo
Rodrigues também prestigiou o desfile do Gandhy ontem. Ele, Gil e Caetano
vestiam o traje completo do afoxé.
E a homenagem ao cantor veio repleta de
detalhes. A rede wifi da sede do bloco neste domingo aparecia nos celulares com
a expressão Beleza Pura, nome da canção de Caetano. Também foi o nome dado ao
uniforme da banda do afoxé este ano, azul marinho com o desenho de girassóis.
A presença de tantos convidados ilustres
no desfile de ontem provocou idas e vindas no processo de saída do afoxé do
Pelourinho, que normalmente acontece às 15h. Mas ontem às 14h30 a presença de
policiais e de outros profissionais do governo na sede do Gandhy indicava que o
governador estaria chegando para participar da entrevista coletiva, junto com o
presidente da entidade, Gilsoney Oliiveira.
Dez minutos antes da entrevista, chegou a
informação de que Jerônimo mudou os planos e se deslocaria diretamente para o
trio elétrico. A essas alturas, os atores Evaldo Macarrão e Humberto Carrão,
ambos vestidos de Gandhy, eram as pessoas mais procuradas na sede para fotos e
entrevistas. Às 15h30, o deputado federal Jorge Solla ainda tinha o seu
turbante sendo fixado à cabeça por uma das costureiras contratadas pelo afoxé.
Quando o presidente do Ghandy chegou para
a coletiva, houve uma intensa movimentação de profissionais de imprensa e o
próprio Gilsoney precisou intervir para evitar que alguém esbarrasse no altar
para exu, que fica perto da entrada do prédio, que foi doado ao bloco em 1992
pelo governo do estado, durante o mandato de Antônio Carlos Magalhães.
Ouro Negro
Gilsoney agradeceu ao governo do estado
pelo dinheiro destinado aos afoxés e blocos afros através do programa Ouro
Negro. "Sem esse dinheiro, não teria sido possível participar do Carnaval
", declarou o presidente.
Sobre as reações ao vídeo em que dois
homens com os trajes do Gandhy aparecem se beijando, Gilsoney negou que a
entidade endosse posturas homofóbicas. "É uma questão da opção sexual de
cada pessoa ", afirmou.
Terminada a entrevista, o secretário de
segurança pública do governo da Bahia, Marcelo Werner, se aproximou da
escultura de exu, fechou os olhos e aparentou fazer uma oração. "É um
pedido de proteção, de bênção no direcionamento dos caminhos, do nosso
dia-a-dia", afirmou o secretário.
Por volta das 16h30, iniciou-se o padê,
ritual de abertura de caminhos que todos os anos o Gandhy realiza antes do
desfile, com a soltura de pombos. "E uma cerimónia comum nos cultos
afrobrasileiros. É a forma que nós encontramos de começar bem nossa festa, de
um jeito positivo", afirmou o diretor executivo do Gandhy, Chico Lima.
Terminado o padé, o bloco começou a se aglomerar para o início do desfile. Aos poucos, as dezenas de homens vestidos de Gandhy espalhados por bares e restaurantes do Centro Histórico começaram a formar o famoso tapete branco, há 75 anos símbolo do Carnaval e da paz. O Filhos de Gandhy sai hoje no circuito Dodô e na terça no Osmar. Correio* / Foto: Fernando Vivas/GOVBA