Ao assumir a cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), em cerimônia marcada para a tarde desta quinta-feira (22), o ministro Flávio Dino vai herdar um acervo de 340 processos em tramitação, entre ações e recursos.
Um
dos casos que passarão às mãos do novo ministro envolve as conclusões finais da
CPI da Covid do Senado e tem como um dos alvos o ex-presidente Jair Bolsonaro.
O ex-presidente foi acusado pelo colegiado de incitação ao crime porque teria
estimulado a população a se aglomerar, não usar máscara e não se vacinar. À
época, a Advocacia-Geral da União rebateu as conclusões da comissão.
As
ações e os recursos que inicialmente vão ficar sob a relatoria do futuro
ministro eram da ministra Rosa Weber, que se aposentou em outubro. Esse
procedimento segue as regras internas do tribunal.
O
conjunto de processos conta com 105 recursos e 235 ações. Deste total, a maior
parte dos procedimentos trata de temas de Direito Administrativo.
Também
fazem parte do conjunto 43 ações constitucionais -- aquelas que discutem a
validade de leis diante da Constituição.
Veja quais são os principais processos que passarão à análise do
novo ministro:
CPI da Covid
O
novo ministro será o relator de um dos pedidos preliminares de apuração enviados
pela Procuradoria-Geral da República (PGR) a partir das conclusões do relatório
final da CPI da Covid, do Senado.
Nesse
procedimento, um dos alvos é o ex-presidente Jair Bolsonaro, além de ministros
e outros agentes públicos da gestão anterior.
Quando
o pedido foi apresentado ao Supremo, a Advocacia-Geral da União (AGU) -- em
documento assinado pelo ex-ministro Bruno Bianco -- defendeu que não havia
elementos mínimos de crime.
Aborto
Dino
não votará na ação que trata da descriminalização do aborto quando ela voltar à
pauta, já que a ministra Rosa Weber apresentou seu voto pouco antes de se
aposentar.
Mas
o novo ministro vai herdar uma nova ação, apresentada em setembro do ano
passado pelo PL, que pede que a punição para abortos provocados por terceiros
seja equiparada à do crime de homicídio qualificado.
Indulto natalino
Passarão
às mãos de Dino recursos e ações que discutem o indulto concedido pelo
ex-presidente Jair Bolsonaro a pessoas com pena de prisão não superior a cinco
anos.
A
Procuradoria-Geral da República questionou um trecho do decreto que concede o
benefício.
A norma estabelece que, quando forem cometidos dois delitos, a contagem deve considerar cada infração de forma individual. Para o Ministério Público, na prática, a regra permite o indulto a "incontáveis" crimes - entre eles, homicídio culposo, lesão corporal simples, grave ou culposa, abandono de incapaz, omissão de socorro, perseguição, crimes contra a honra, importunação sexual, entre outros. Na seara eleitoral, para o MP, o perdão poderia alcançar, por exemplo, quem comete o crime de divulgar fake news em propaganda eleitoral.
Novas ações
Assim
que tomar posse como ministro, Dino também passa a fazer parte da distribuição
dos processos que chegarem ao Supremo Tribunal.
Ou
seja, a partir da posse, procedimentos que chegarem ao Supremo podem ser
enviados ao novo ministro.
Ele
pode assumir os casos por sorteio ou pela chamada prevenção - se tiver, em seu
gabinete, ação ou recurso que trate de tema semelhante ao novo processo.
Composição do STF
o
Supremo Tribunal Federal terá novamente a composição completa, com 11
ministros. Desde outubro do ano passado, com a aposentadoria da ministra Rosa
Weber, o tribunal contava com dez magistrados.
Flávio
Dino é a segunda indicação do presidente Lula para o Supremo Tribunal Federal
em seu terceiro mandato. Ele vai assumir a vaga aberta com a saída de Weber.
Com
Dino no Supremo, o presidente Lula passará a ter quatro magistrados escolhidos
por ele em atuação no tribunal.
Além
disso, os dois presidentes eleitos pelo PT somam sete nomeações para o tribunal
- são três da ex-presidente Dilma Rousseff e outras quatro do presidente Lula.
Outras
duas foram feitas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Os ex-presidentes Michel
Temer e Fernando Henrique Cardoso contam com uma escolha cada.
Pela
Constituição, o Supremo é formado por 11 ministros, nomeados pelo presidente da
República após sabatina e aprovação no Senado Federal.
O
escolhido deve ter entre 35 e 70 anos de idade, além de "notável saber
jurídico e reputação ilibada". A idade máxima para a escolha foi alterada
por emenda à Constituição em 2022 - antes, era de 65 anos.
Ainda
pelo texto constitucional, a idade limite para se manter na ativa é de 75 anos
- atingido o limite, o ministro do Supremo deve se aposentar. A mudança na
faixa etária ocorreu em 2015, pela chamada "PEC da Bengala".
Com
isso, considerando apenas a data da aposentadoria compulsória, Dino poderá
ficar 19 anos na Corte.
Veja a composição atual do Supremo Tribunal Federal:
Gilmar Mendes - nomeado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) -
2002
Decano
da Corte, o ministro Gilmar Mendes nasceu em Diamantino (MT) e formou-se na Universidade
de Brasília (UnB). É também mestre pela Unb e tem doutorado na Universidade de
Münster (Alemanha). Antes de chegar ao STF, foi procurador da República e
advogado-geral da União. Presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entre
2016 e 2018. Entre 2008 e 2010, ocupou a Presidência do STF e do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ).
Cármen Lúcia - nomeada por Lula (PT) - 2006
Nascida
em Montes Claros (MG), a ministra cursou Direito na Pontifícia Universidade
Católica (PUC-MG). Na mesma instituição, anos depois, foi professora titular de
Direito Constitucional. Em 2006, deixou o cargo de procuradora do Estado de
Minas Gerais para ser ministra do STF. Como a primeira mulher a chegar à
Presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), comandou as eleições
municipais de 2012. Presidiu a Suprema Corte entre 2016 e 2018.
Dias Toffoli - nomeado por Lula (PT) - 2009
Presidiu
o Supremo entre 2018 e 2020, como o mais jovem ministro a ocupar o cargo, aos
50 anos. Natural de Marília (SP), o ministro se formou em Direito em 1990 pela
Faculdade do Largo de São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP).
Advogou em São Paulo, foi professor em Brasília, assessorou o PT na Câmara e
chefiou a área de assuntos jurídicos da Casa Civil. Ainda no governo Lula,
exerceu o cargo de advogado-geral da União (AGU). Entre 2014 e 2016, presidiu o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Luiz Fux - nomeado por Dilma Rousseff (PT) - 2011
O
ministro nasceu no Rio de Janeiro (RJ). Formado em Direito pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 1976, exerceu a advocacia por dois anos e
foi promotor de Justiça por mais três anos. Antes de chegar ao STF, Fux foi
juiz de Direito e eleitoral, desembargador e ministro no Superior Tribunal de
Justiça (STJ). Ocupou a Presidência do tribunal entre 2020 e 2022, durante a
pandemia da Covid-19. Em 2018, presidiu o TSE.
Luís Roberto Barroso - nomeado por Dilma Rousseff (PT) - 2013
Natural
de Vassouras (RJ), o ministro graduou-se na Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj). É professor titular de Direito Constitucional na mesma
instituição. Fez mestrado na Universidade de Yale (EUA), doutorado na Uerj e
pós-doutorado na Universidade de Harvard (EUA). Antes de chegar ao Supremo,
nomeado pela então presidente Dilma Rousseff, também foi procurador do Estado
do Rio de Janeiro e atuou como advogado. Presidiu o TSE entre 2020 e 2022.
Edson Fachin - nomeado por Dilma Rousseff (PT) - 2015
Nascido
em Rondinha (RS), Fachin graduou-se em Direito pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR), onde atualmente dá aulas Direito Civil. Antes disso, concluiu
mestrado em 1986 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde também
fez doutorado. Fez pós-doutorado no Canadá, foi pesquisador convidado do
Instituto Max Planck, na Alemanha, e professor visitante do King's College, na
Inglaterra. Comandou o TSE em 2022.
Alexandre de Moraes - nomeado por Michel Temer (MDB) - 2017
O
ministro nasceu em São Paulo (SP) e se formou em direito pela Universidade de
São Paulo. É doutor em Direito do Estado. Foi promotor de Justiça em São Paulo
por 11 anos. Em 2002 foi nomeado secretário de Justiça do estado. Depois, foi
secretário de Segurança Pública e ministro da Justiça do governo Temer. É o
atual presidente do TSE - atua na Corte Eleitoral desde agosto de 2022 e vai estar
à frente do tribunal até 2024.
Nunes Marques - nomeado por Jair Bolsonaro (PL) - 2020
Nunes
Marques é natural de Teresina (PI). Antes de chegar ao STF, integrou o Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), do qual foi vice-presidente entre 2018 e
2020. O magistrado também já foi advogado e juiz do Tribunal Regional Eleitoral
do Piauí (TRE-PI). Neste ano, tornou-se membro efetivo do TSE.
André Mendonça - nomeado por Jair Bolsonaro (PL) - 2021
Natural
de Santos (SP), o ministro é doutor em Direito pela Universidade de Salamanca,
na Espanha, com título reconhecido na Universidade de São Paulo. Atua como
professor universitário no Brasil e no exterior. Por quase 22 anos, André
Mendonça teve carreira na Advocacia-Geral da União (AGU) - instituição que chefiou
por duas vezes. Foi ministro da Justiça e Segurança Pública, no período de 2020
a 2021.
Cristiano Zanin - nomeado por Lula (PT) - 2023
Nascido
em Piracicaba (SP), Zanin se formou em direito pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP) e é especialista em litígios estratégicos e
decisivos, empresariais ou criminais, nacionais e transacionais. O novo
ministro se notabilizou por defender o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos
processos penais da operação Lava Jato desde 2013. O presidente chegou a ser
condenado e preso, mas teve as condenações anuladas pelo STF após recursos
assinados pelo advogado.
Flávio Dino - nomeado por Lula (PT) - 2024
De
São Luís (MA), Flávio Dino é formado em direito pela Universidade Federal do
Maranhão e é mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco.
Começou a carreira na magistratura em 1994, quando se tornou juiz federal. Em
2006, passou para a carreira política, quando foi eleito deputado federal, pelo
PCdoB. Dino foi governador, senador e, a partir do terceiro governo Lula,
comandou o Ministério da Justiça.
Dez homens, uma mulher
Com
Dino no tribunal, a Corte terá apenas uma magistrada em sua composição - a
ministra Cármen Lúcia. Pelas regras atuais, Cármen Lúcia poderá ficar no cargo
até 2029, quando alcançar a idade para a aposentadoria compulsória.
Em
132 anos de história, o Supremo Tribunal Federal (STF) teve, em sua composição,
171 ministros - quando o futuro ministro tomar posse, serão 172. Entre eles,
apenas três mulheres - e nenhuma delas negra.
A
instalação do Supremo ocorreu em fevereiro de 1891, no início do período
republicano brasileiro. Ao longo do século XX, as composições do tribunal foram
dominadas por homens.
Informações, G1 / Foto: Tom Costa / MJSP