A Cúpula dos Líderes sobre o Clima, convocada pelo presidente americano Joe Biden, começa nesta quinta-feira, Dia da Terra, às 9h, em formato virtual, e será transmitida em tempo real. O presidente Jair Bolsonaro discursará na sessão de abertura ao lado de outros 26 presidentes e primeiros-ministros, incluindo o próprio Biden, o chinês Xi Jinping e o russo Vladimir Putin. Ao todo, mais de 40 líderes internacionais participarão da cúpula de dois dias, incluindo o Papa Francisco.
A cúpula é o maior desafio diplomático já enfrentado por
Bolsonaro porque põe em xeque a relação com os Estados Unidos pós-Trump e expõe
a falta de compromisso do seu governo com as metas que o próprio Brasil
estabeleceu cumprir como signatário do Acordo de Paris sobre o clima, de 2015.
Por esse acordo, o país se comprometeu, por exemplo, a a acabar com o
desmatamento ilegal até 2030. Mas, durante o atual governo, as taxas oficiais
de devastação da Amazônia Legal foram as mais altas desde 2008, segundo o
sistema de monitoramento oficial Prodes. Em 2019, foram 10.129 km² desmatados,
e em 2020, 11.088 km².
Na cúpula, Biden busca estabelecer a liderança americana no tema
climático após o recuo drástico promovido por Trump, que tirou os Estados
Unidos do Acordo de Paris. Ele cobra que os países participantes se disponham a
apresentar metas mais ambiciosas para a redução da emissão de gases de efeito
estufa, que causam o aquecimento global, até a Cúpula do Clima da ONU, a
COP-26, que ocorrerá em Glasgow, na Escócia, em novembro deste ano.
O próprio Biden pretende apresentar na cúpula metas mais
ambiciosas para os Estados Unidos. O mesmo deverá ser feito pelos 27 países da
União Europeia, pelo Reino Unido, pela China e pela Rússia.
Bolsonaro, ao contrário, tem indicado que não pretende mudar as
metas de 2015 — reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e
43% até 2030. Em 2020, ao reafirmar essas metas, o governo reviu o índice de
liberação de poluentes em 2005, o ano de referência. Isso lhe permitiria
cumprir o compromisso internacional mesmo se o desmatamento da Amazônia neste
ano for maior que 13 mil km², superior ao registrado em 2020.
A maior parte das emissões brasileiras vem do desmatamento, mas
o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, alega que o Brasil deveria ter
recebido US$ 133 bilhões pela redução do desmate ocorrida entre 2006 e 2017 –
em governos passados. O cálculo de Salles se baseia no mercado livre de carbono
da Califórnia. A regulamentação de um mercado internacional de carbono está
prevista no Acordo de Paris, mas ainda não foi feita.
O Brasil já recebeu recursos da ONU por reduzir o desmatamento
entre 2014 e 2015 e doações bilionárias da Noruega e da Alemanha para o Fundo
Amazônia, mas R$ 2,9 bilhões desse fundo tiveram sua aplicação congelada após a
extinção de comitês gestores pelo governo.
Salles alega que os países que mais contribuem para as emissões
de gases do efeito estufa, entre eles os EUA e a China, deveriam pagar o Brasil
para não desmatar. O Brasil é o sexto maior poluidor do planeta, com uma
contribuição de 3% do total de emissões.
Cientistas do clima afirmam que o argumento de Salles não faz
sentido, porque interessa ao próprio Brasil não desmatar. Eles explicam que a
Floresta Amazônica retém nas árvores e no solo uma quantidade equivalente a
todo o carbono emitido pelo planeta nos últimos dez anos. A destruição desse
bioma teria efeito catastróficos no clima e prejudicaria a própria agricultura,
um dos carros-chefes da economia brasileira.
Além do aumento do desmatamento, prejudica o Brasil a percepção
de que ele é uma política proposital. No governo Bolsonaro, os órgãos federais
de vigilância ambiental foram sucateados. O orçamento do Ministério do Meio
Ambiente previsto para 2021 é o menor desde o início do século. Além disso,
houve neste ano uma redução nos recursos destinados para o Ibama, de 29,1%, e
para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) , de
40,4%. No Ibama, há um déficit de, no mínimo, 500 fiscais. Na última semana, o
então superintendente da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva enviou
uma notícia-crime contra Salles por favorecimento a madeireiros ilegais. No dia
seguinte, a PF anunciou sua substituição.
Em seu discurso hoje, prevê-se que Bolsonaro apresentará um
plano com cinco eixos para reduzir o desmatamento: ações de comando e controle,
regularização fundiária, pagamentos por serviços ambientais, ações de
zoneamento ecológico-econômico e promoção da bioeconomia. Os cinco itens fazem
parte do Plano Nacional para Combate do Desmatamento Ilegal, lançado no ano
passado, que Salles já admitiu não ter decolado por falta de engajamento de
outros ministérios.
A grande questão é se Bolsonaro conseguirá convencer os demais
participantes da cúpula e o próprio Biden. O governo do democrata buscou o
diálogo com o Planalto antes da cúpula e várias reuniões bilaterais ocorreram.
No entanto, a Casa Branca tem ressaltado que, para que ocorram negociações de
verdade e uma eventual ajuda ao Brasil na área climática, o país precisa
apresentar resultados em matéria de redução do desmatamento. Segundo disse
Thomas Shannon, ex-embaixador americano no Brasil (2009-2013), "os EUA
deixaram claro seu interesse em trabalhar com o Brasil, agora a bola está do
lado dos brasileiros". Informações, yahoo /