A baixaria publicada no
Twitter do presidente deixou perplexos os ministros do Supremo. E Celso de
Mello, o decano da Casa, foi porta-voz da insatisfação, manifestando-se com
dureza rara. Afirmou em conversa com a Folha que o "atrevimento do
presidente parece não ter limites". E acrescentou: "Esse
comportamento revelado no vídeo em questão, além de caracterizar absoluta falta
de 'gravitas' e de apropriada estatura presidencial, também constitui a
expressão odiosa (e profundamente lamentável) de quem desconhece o dogma da
separação de Poderes e, o que é mais grave, de quem teme um Poder Judiciário
independente e consciente de que ninguém, nem mesmo o Presidente da República,
está acima da autoridade da Constituição e das leis da República".
"Gravitas", em
latim, quer dizer, originalmente, peso. Por associação de ideias, significa
"dignidade", "seriedade", "apego à honra". Leiam
no pé do post a íntegra da nota enviada pelo decano à Folha.
PASSOU DOS LIMITES
Dias
Toffoli, até por ser chefe de um Poder, é um dos interlocutores de Bolsonaro. O
ministro tem atuado para tentar, vamos dizer, aparar as arestas na relação
entre o presidente da República e a Corte. Diatribes e agressões que aparecem
em nome do presidente nas redes sociais são atribuídas ao destempero do filho.
Mas os ministros já
começam a se perguntar o óbvio: até onde Bolsonaro é, de fato, surpreendido
pelas malcriações de Carlos e até onde se está diante de um jogo combinado?
Afinal, se o presidente não quer ser atropelado por publicações que não são do
seu agrado, por que Carlos continua a ser o dono das senhas das contas do pai
nas redes sociais?
Os ministros do Supremo
já se cansaram de ser saco de pancada do bolsonarismo. Convenham: até agora, o
presidente não disse de própria voz e com todas as letras que ele, como chefe
do Executivo, não tem de se meter em coisas como CPI da Lava Toga ou
julgamentos em curso na Corte.
Ou por outra: o
presidente parece ter a ilusão de que pode ser, a um só tempo, o beneficiário
dos cachorros loucos das redes sociais e da contenção institucional levada a
efeito pelo Supremo, mas que excita as fúrias hidrófobas.
Segue a íntegra da nota
de Celso de Mello:
A ser verdadeira a
postagem feita pelo Senhor Presidente da República em sua conta pessoal no
"Twitter", torna-se evidente que o atrevimento presidencial parece
não encontrar limites na compostura que um Chefe de Estado deve demonstrar no
exercício de suas altas funções, pois o vídeo que equipara, ofensivamente, o
Supremo Tribunal Federal a uma "hiena" culmina, de modo absurdo e
grosseiro, por falsamente identificar a Suprema Corte como um de seus
opositores.
Esse comportamento
revelado no vídeo em questão, além de caracterizar absoluta falta de
"gravitas" e de apropriada estatura presidencial, também constitui a
expressão odiosa (e profundamente lamentável) de quem desconhece o dogma da
separação de poderes e, o que é mais grave, de quem teme um Poder Judiciário
independente e consciente de que ninguém, nem mesmo o Presidente da República,
está acima da autoridade da Constituição e das leis da República.
É imperioso que o Senhor
Presidente da República —que não é um "monarca presidencial", como se
o nosso país absurdamente fosse uma selva na qual o Leão imperasse com poderes
absolutos e ilimitados— saiba que, em uma sociedade civilizada e de perfil
democrático, jamais haverá cidadãos livres sem um Poder Judiciário
independente, como o é a Magistratura do Brasil. Informações reinaldoazevedo / Foto Carlos Moura/STF