A promessa
de greve dos caminhoneiros partiu de vez para a disputa política interna.
Depois de lideranças autônomas se encontraram com o governo na última semana, a
Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) e outros líderes se
reuniram ontem com o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, para
defender demandas da categoria. As principais reivindicações são as mesmas
propostas nos últimos encontros, como o cumprimento do piso mínimo de frete e
da jornada de trabalho. A diferença está na disputa de poder cada vez mais
evidenciada. Na nova rodada de reuniões, líderes recebidos pelo governo se
dizem os reais representantes.
O
caminhoneiro Wanderlei Alves, conhecido como Dedéco, que promete a greve para
29 de abril, participou da reunião. Antes do encontro, “lavou as mãos” ao ser
questionado sobre a ameaça e disse que a resposta de “paralisação ou não” virá
do governo. O presidente da CNTA, Diumar Bueno, endossou o argumento e disse
que a possibilidade de nova greve “está nas mãos do governo”. Os representantes
não esconderam a insatisfação da articulação feita entre Freitas e outras
lideranças, como Walla Landim, o Chorão, um dos principais líderes da greve do
ano passado.
A guerra
interna é transparente e só amplia a desunião da categoria sem sinalizar uma
interlocução capaz de desarmar a promessa de greve. A leitura feita pelos
próprios caminhoneiros é que há uma divisão de lideranças para saber quem é o
representante da classe. Dedéco e Chorão concorreram às últimas eleições para
deputado federal pelo Podemos no Paraná e em Goiás, respectivamente. Apesar da
derrota de ambos, Chorão conseguiu se aproximar do governo e mantém diálogo com
Freitas e o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Já Dedéco
alega que o governo “fechou as portas”. Ele mesmo afirma ser o responsável por
ter vazado áudios gravados por Lorenzoni dizendo que o governo havia
estabelecido uma “trava” nos reajustes do óleo diesel feitos pela Petrobras. O
grupo de líderes caminhoneiros que não é ligado a ele o acusa de se aproximar
de Bueno, um desafeto antigo, apenas para se alçar como um dos principais nomes
no setor e articulador dos autônomos. Em um vídeo que circula em grupos de
WhatsApp, um homem o hostiliza, o chama de “massa de manobra” e diz que, no
Porto de Santos, nenhum caminhoneiro vai parar em 29 de abril.
A própria
CNTA, no entendimento de transportadores ligados a Chorão, quer retomar o prestígio
e manter a estrutura. Na greve do ano passado, a entidade negociou os primeiros
acordos com o governo do ex-presidente Michel Temer, mas a paralisação se
manteve, evidenciando, para alguns, uma falta de comando entre autônomos que
não se sentem representados por sindicatos. Foi ali que Chorão cresceu dentro
da classe e passou a conversar com a gestão emedebista.
Tensão
Os
transportadores ligados a Dedéco, por sua vez, dizem que Chorão não é
caminhoneiro, sugerindo que ele não tem poder para representar a classe. É o
que afirmou o caminhoneiro Fabiano “Careca”, de Governador Valadares, ao
ministro da Infraestrutura, em vídeo gravado durante a reunião de ontem. “Morei
em São Paulo e sei das histórias do Chorão, que é representante de van escolar.
Nunca dirigiu um caminhão, não tem ANTT (documento). Mas fica me humilhando e
ameaçando de morte”, acusou. Chorão nega as acusações e diz que luta pela
categoria.
A reunião
entre Freitas e os caminhoneiros teve momentos de tensão. Em um dos momentos,
em fala gravada em vídeo, o ministro explica que não é simples ampliar a
produção do óleo diesel como em um toque de mágica. “Não é assim (...) a fada
madrinha chega, bate lá uma varinha na Petrobras e amanhã estamos produzindo
óleo diesel. Nós importamos óleo diesel”, afirmou, ao ser interrompido e
pedindo para concluir o raciocínio. “Deixa eu falar, se não, não vamos
conseguir ter uma reunião organizada e não vamos chegar a lugar algum”,
ponderou. Entre os pontos que ele se comprometeu está o cumprimento do
“gatilho” na tabela do frete mínimo, em que se aumenta o valor do frete
conforme o diesel é reajustado em 10%.|Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil