Após
o alerta provocado pela tragédia de Brumadinho, em Minas Gerais, será
intensificado o monitoramento das barragens de rejeitos existentes no estado
baiano, segundo a Agência Nacional de Mineração na Bahia (ANM).
Até esta segunda-feira (28), 60 mortes foram contabilizadas e,
ao menos, 292 pessoas estão desaparecidas, na cidade mineira. O estado,
tem um pequeno número de barragens de rejeitos, em relação a Minas Gerais. Ao
todo, são 14, entre elas, as que têm mais alto potencial de dano estão em
Jacobina (duas), Santa Luz (uma) e Itagibá (uma).
A intensificação do monitoramento das unidades é uma medida
preventiva. Em Jacobina, no Centro-Norte Baiano, as atividades da Jacobina
Mineração e Comércio Ltda., controlada pela multinacional canadense Yamana Gold
Inc, têm sido constantemente fiscalizadas pelo Ministério Público da Bahia
(MP-BA), através da Promotoria de Justiça especializada em meio ambiente de
âmbito regional, representada pelo promotor Pablo Almeida. Na cidade, estão
duas barragens de rejeitos de mineração, uma ao lado da outra, denominadas de
BI e BII, a primeira em processo de fechamento e a segunda em atividade.
A B1 foi utilizada de 1982 a 2012, sendo que o processo de
fechamento vem se desenvolvendo desde então, sem novas disposições de rejeitos.
Na última terça-feira (22), elas foram inspecionadas pela equipe técnica da
Central de Apoio Técnico do Ministério Público da Bahia (Ceat), no bojo de
inquérito civil em tramitação.
Ao BNews, o promotor Pablo Almeida lembra que, em 1992, o
Ministério Público Estadual já havia ingressado com ação civil pública
ambiental, questionando diversos aspectos da atividade de mineração, incluindo
o funcionamento da Barragem 1. Nesta ação, foram designados dois peritos pelo
juiz, os quais afirmaram, em laudo, que “a barragem de rejeitos não é capaz de
fornecer adequada proteção ao lençol freático (água subterrânea) que alimenta a
bacia hidrográfica do Rio Itapicuru”, e que “a impermeabilização natural
(barragem de maciço ciclonado) utilizada pela Jacobina Mineração não propicia
adequada impermeabilização do solo, conforme exigências mundialmente aceitas”.
A ação não foi definitivamente julgada no primeiro grau de
jurisdição. No último dia 10, a empresa e o Ministério Público discutiram
a possibilidade de um acordo judicial para a resoluções de questões apontadas
na ação civil pública e outras quatro ações já propostas pela promotoria de
Jacobina contra a JMC – Yamana Gold.
As conversas devem durar 90 dias. “Nas ações, foram formulados
pedidos de paralisação das atividades, para a realização de adequações
ambientais, pleitos não acolhidos ou analisados pela Justiça.
Atualmente, a B1 é monitorada por 15 piezômetros, que analisam o
comportamento do subsolo, bem como através de poços de monitoramento, que
analisam a qualidade do líquido existente no interior da barragem. Em razão do
processo de fechamento da B1, e ante a não disposição de novos rejeitos, houve
uma redução de quase 70% do material líquido lá existente.
Todavia, como a barragem não é impermeabilizada, este material
drena para as águas subterrâneas, sendo carreado aos recursos hídricos da
região, processo que pode ser agravado durante as chuvas”, conta o
promotor.
De acordo com Almeida, para aumentar a segurança da barragem 1,
“é fundamental a melhoria do sistema de drenagem das águas superficiais da
barragem, drenagem de águas pluviais, estudos da influência da drenagem natural
subterrânea, à montante da B1, no rejeito saturado no interior da barragem, bem
como medidas que impeçam que essa drenagem, de característica ácida, atinja os
recursos hídricos vizinhos ao empreendimento”.
O promotor detalha que, a barragem de rejeitos 2 será utilizada,
segundo previsão da empresa, até o ano de 2036, quando atingirá a altura de 92
metros e volume armazenado de mais de 42 milhões de metros cúbicos. “Trata-se
de estrutura mais moderna, com impermeabilização do solo, através de mantas
termoplásticas de polietileno de alta densidade (PEAD), o que oferece uma maior
segurança e melhor adequação ambiental.
A barragem II é acompanhada diariamente por
técnicos da empresa, que fazem dois relatórios quinzenais e encaminham os dados
mensalmente à Agência Nacional de Mineração. Ainda sob a perspectiva de
controle interno, são realizadas análises de performance uma vez por mês,
através de auditoria interna, em nível de diretoria internacional”, detalha.
Almeida
destaca também a auditoria externa feita por empresa contratada, na qual são
apontados problemas e cobradas soluções. Além disso, a JMC possui auditor internacional
independente para segurança de barragem, e também é controlada e acompanhada
pela ANM e pelo Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado da
Bahia (Inema).
“Entretanto, o Ministério Público Estadual avalia que a JMC –
Yamana Gold, diante do seu porte e considerando os riscos envolvidos, é
fiscalizada poucas vezes por ano pelo Inema e ANM. Assim, aquela que é hoje a
maior empresa de mineração em atividade no estado da Bahia, foi fiscalizada 10
vezes em oito anos. Uma média de fiscalização a cada 292 dias. O DNPM
[Departamento Nacional de Produção Mineral] informou que nem sempre fazia
relatórios das inspeções na planta, o que mais se assemelha a uma visita de
cortesia do que a uma inspeção, mesmo porque a Administração Pública se orienta
pelo princípio da oficialidade.
Não bastasse tudo isso, o próprio DNPM informa que a empresa
descumpriu notificações e cumpriu outras intempestivamente”, diz o
promotor. Ao MP, o Inema informou que, não consta no órgão qualquer
registro de fiscalização em galerias subterrâneas da empresa Jacobina Mineração
e Comércio.
“Em todas essas décadas de atividade, o Inema nunca fiscalizou
os impactos da mineração em subsolo. Por tal razão, o Ministério Público
recomendou ao órgão, por exemplo, que proceda fiscalizações ambientais no
interior e nos arredores da empresa, para identificação de danos ambientais,
bem como estabeleça cronograma de fiscalização, pelo menos mensal, do
empreendimento da JMC – Yamana Gold”, explica.
Entre as recomendações do MP ao Inema, está a coleta de amostras de solo, água,
efluentes, nas galerias subterrâneas, em pelo menos 30 pontos
georreferenciados, com encaminhamento destas amostras para análises técnicas
públicas, com produção de relatórios e encaminhamento a ANM, Secretaria Municipal
de Meio Ambiente e ao Ministério Público, com os parâmetros Resolução CONAMA
357/05 e da Portaria MS n. 518/2004;
O promotor revela também que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) também foi oficiado, para que
intensificasse as fiscalizações. “Em relação a Jacobina, o Ibama se manteve
inerte, apesar de após a tragédia de Brumadinho, em Minas Gerais, divulgou ter
aplicado multa de R$ 250 milhões em razão do rompimento da barragem. Assim,
atua na tragédia de Brumadinho, mas não exerce atividade preventiva em
Jacobina, o que é fato digno de nota”, salienta.
O promotor argumenta que apesar de todos esses controles, é preciso ter plano
de emergência e promover simulado com funcionários e população. “No dia 22 de
janeiro de 2019, o MP e a empresa discutiram a necessidade de instalação das
sirenes de emergência, já adquiridas ao custo de 1 milhão de dólares, em
continuidade ao trabalho de sinalização das áreas de risco e pontos de
encontro”, diz.
As áreas de maior risco, de acordo com o MP-BA, se localizam até sete
quilômetros das barragens de rejeitos, com maior ênfase nos quatro quilômetros
iniciais. A empresa já efetuou o cadastramento de todas as famílias localizadas
nessa região, um total de mais de 200 unidades familiares, as quais receberam
orientações e foram convocadas a participar dos simulados e treinamentos.
“O Ministério Público avalia ser necessária a retomada das negociações para a
realocação das famílias em zonas de maior risco, processo que foi interrompido
em 2013, bem como que a empresa JMC – Yamana Gold atribua maior transparência
ao Plano de Emergência, rotas de fugas, divulgue amplamente os dados de
monitoramento das barragens, para população em geral, explicando onde estão as
áreas de maior risco, rotas de fugas, dentre outras medidas”, pondera o
promotor. Por fim, Almeida avalia que que após a audiência pública, “a
empresa JMC – Yamana Gold tem adotado postura mais colaborativa, resolutiva e
transparente”.