O decreto do presidente Jair Bolsonaro que flexibilizou a posse
de armas de fogo no Brasil é questionado por uma ação popular que tramita na
Justiça Federal de São Paulo. Assinada pelo advogado Carlos Alexandre Klomfahs,
a peça aponta dez obras científicas que relacionam crimes violentos à
disponibilidade de armas. Ainda sustenta que as mudanças só poderiam ter sido
feitas com a participação do Congresso Nacional.
O
presidente Jair Bolsonaro assinou no dia 15 de janeiro decreto que altera
regras para facilitar a posse de armas de fogo, ou seja, a possibilidade de o
cidadão guardar o equipamento em sua residência ou estabelecimento comercial.
Decreto que
regulamenta o Estatuto do Desarmamento
Entre as mudanças, foi ampliado o prazo de validade do registro
de armas de 5 para 10 anos, tanto para civis como para militares Também não
será mais preciso comprovar a "necessidade efetiva" para a obtenção
da posse: o interessado precisará apenas argumentar que mora em cidade violenta,
em área rural ou que é agente de segurança.
Em
ação popular, o advogado Carlos Alexandre Klomfahs cita dez autores que tratam
sobre a relação entre a disponibilidade de armas e violência.
"Bem
como ausência de reflexão, estudos e ponderações sobre a visão científica do
tema "porte de armas" e inobservância do Estatuto do Desarmamento
enquanto política permanente de defesa dos direitos fundamentais, pois como se
verá trata-se de tema sensível aos direitos humanos, segurança pública, saúde
pública e proibição de retrocesso social quanto a proteção às crianças,
adolescentes, mulheres, prevenção ao suicídio e vítimas de acidentes com
armas", sustenta.
Para
o advogado, "houve assim clarividente desconsideração de trabalhos
científicos nas áreas de psicologia, criminologia, medicina e traumatologia,
antropologia, economia e ciência política, e mais de 13 variáveis não
consideradas, muito menos discutidas, resultando daí seu interesse notadamente
público e sua proteção por meio desta ação popular".
Klomphas
reforça que a discussão abrange mais "do que dois grupos disputando pró e
contra". "É bem mais do que um viés político onde 'devo cumprir a
vontade daqueles que me elegeram'. Trata-se de política de segurança pública,
saúde pública, direitos fundamentais de ambos os lados: vítimas e
criminosos", reforça.
O
advogado afirma não estar "a favor nem da direita nem da esquerda e sim em
defesa da Constituição em qualquer governo que não a observe". O
reducionismo "é um direito do cidadão", sem considerar os diversos
trabalhos científicos publicados no Brasil e no exterior há pelo menos trinta
anos é uma política fadada ao fracasso ao custo de milhares de vidas".
O
advogado ainda afirma que, ao editar o decreto, o governo usurpou a competência
do Legislativo. "É pacífica na jurisprudência que decretos presidenciais
(do Poder Executivo) previstos não podem alterar o conteúdo material de uma
lei, nem para mais nem para menos. Uma vez que essa prerrogativa é do Poder
Legislativo".
O
advogado ainda diz que "o decreto anterior (Decreto n. 5 123/2004)
regulamenta uma Lei (Lei n. 10.826/2003) decretada pelo Congresso Nacional e
sancionada pela Presidência da República. Portanto, somente o Poder Legislativo
poderia alterar, ampliando ou restringindo o conteúdo de uma lei por ele
debatida, votada e aprovada interna corporis, modificando legitimamente as
relações jurídicas no seio da sociedade".
"Esta
é conquista democrática recente do Poder Legislativo sufragado pelo Poder
Executivo e de alta significância para o Estado Democrático de Direito",
anotou. [estadão / Alan Santos/PR]