Um pedido de vista do ministro Luiz Fux
suspendeu nesta quinta-feira, 29, o julgamento no plenário do Supremo Tribunal
Federal (STF) que analisa o decreto de indulto de
Natal editado pelo presidente Michel Temer (MDB) em dezembro de 2017. Movida
pela Procuradoria-Geral da República (PGR), a ação questiona se condenados por
crimes de corrupção e contra a
administração pública podem ser beneficiados, como prevê o indulto de Temer.
Até o momento, votaram oito ministros: seis favoráveis ao decreto do presidente
e dois contrários – já há, portanto, maioria para manter a medida tal qual
assinada pelo emedebista.
O indulto de Michel Temer abrange condenados a
até doze anos de prisão e que, até 25 de dezembro de 2016, tivessem cumprido um
quinto da pena, desde que não fossem reincidentes. Antes, para os crimes cometidos sem
grave ameaça ou violência, era preciso cumprir um quarto da pena no caso dos
que não eram reincidentes.
Em março, após ter sido suspensa pela então
presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, a medida assinada por Temer havia
sido limitada por uma decisão liminar do ministro Luís Roberto Barroso, que
excluiu sentenciados por este tipo de delito do decreto. Nas sessões de
ontem e desta quinta-feira, o entendimento de Luís Roberto Barroso, mantido em
seu voto, foi seguido por Edson Fachin.
Alexandre de Moraes divergiu de
Barroso e foi acompanhado por Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio
Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Os seis ministros entendem que não cabe
ao Supremo “reescrever” o decreto de indulto, prerrogativa exclusiva do
presidente da República.
Além de Luiz Fux, ainda não votaram Cármen Lúcia e
Dias Toffoli, presidente do STF.
Após a formação de maioria, Gilmar Mendes sugeriu a
revogação da liminar concedida monocraticamente por Luís Roberto Barroso em
março e o tema foi levado a votação por Toffoli.
Neste ponto, Barroso, Fachin, Fux, Rosa e Cármen
votaram por manter a decisão do relator, enquanto Gilmar, Moraes, Marco Aurélio
e Mello se posicionaram pela revogação. Ricardo Lewandowski já havia se
retirado do plenário e restava o voto de Dias Toffoli. Caso ele se posicionasse
pela manutenção da liminar, o entendimento seria majoritário, com seis votos;
caso votasse por derrubá-la, o julgamento seria suspenso até que Lewandowski se
manifestasse. O presidente do Supremo, contudo, não fez uma coisa nem outra e
optou por pedir vista.
Com os pedidos de vista de Fux e Toffoli, a decisão
monocrática de Luís Roberto Barroso segue vigente.
Os oito votos
Em seu voto, o relator da Ação Direta de
Inconstitucionalidade movida pela PGR, Luís Roberto Barroso, defendeu que não
sejam atingidos pelo indulto natalino condenados pelos crimes de corrupção
ativa, corrupção passiva, concussão, peculato, tráfico de influência, os
praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de
Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos
na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa – todos figuram
entre as principais acusações envolvendo políticos.
O argumento central do voto de Barroso para limitar
os efeitos do decreto de Michel Temer é o de que os crimes de corrupção não se
enquadram nas duas justificativas a que o benefício se destina: caráter
humanitário e descongestionamento do sistema penitenciário, uma vez que, entre
os cerca de 725.000 presos no país, apenas 0,25% estão detidos por crimes de
colarinho branco.
Ele também considerou que o indulto não deve se
aplicar às penas de multa em processos de corrupção.
Em seguida, Alexandre de Moraes deu
seu voto e discordou do relator. Ele considera que o indulto é ato
privativo do presidente da República e argumentou que, como o decreto de
Temer está dentro das “opções constitucionalmente previstas”, não cabe ao STF
“reescrevê-lo”. Conforme a Constituição, só não podem ser indultados crimes
hediondos, de terrorismo, de tortura e tráfico de drogas.
Nesta quinta, Edson Fachin acompanhou
a posição de Luís Roberto Barroso no sentido de excluir os condenados por
corrupção do alcance do indulto presidencial. O ministro entende que o decreto
é um poder do presidente da República, mas que “isso não leva a
compreender que este poder seja ilimitado”.
“É necessário reconhecer que não
se lhe pode aplicar aos crimes de peculato, concussão, corrupção passiva,
corrupção ativa, tráfico de influência, crimes contra o sistema financeiro,
crimes previstos na lei de licitações, crimes de lavagem e dinheiro e ocultação
de bens e os previstos na lei de organizações criminosas e associação
criminosa”, afirmou Edson Fachin, para quem o indulto só pode ter efeito sobre
sentenças condenadas em julgado, isto é, contra as quais não caiba mais
recurso.
Segunda a votar na sessão de
hoje, a ministra Rosa Weber seguiu a
posição de Alexandre de Moraes. Para ela o indulto presidencial é
“prerrogativa do poder Executivo, dentro da moldura democrática constitucional,
em atenção à doutrina de separação dos poderes”.
Rosa disse não ver como
“invalidar” constitucionalmente o decreto assinado por Michel Temer e que
“gostemos ou não, [o indulto] integra o sistema de freios e contrapesos [entre
os Poderes]”.
Para Ricardo Lewandowski,
que antecipou seu voto, o ato de indultar penas é de “amplíssima
discricionariedade” do presidente e, portanto, “imune” ao controle pelo
Judiciário se não houver afronta à Constituição. “A impugnação judicial do
ato só está autorizada se houve clara ofensa às regras constitucionais, o que,
a meu ver, não ficou demonstrado no caso sob análise”, disse o ministro.
Ele avalia que o decreto editado
por Michel Temer “foi concedido de acordo com critérios objetivos e impessoais”
e que “não se pode considerar, como pretende a requerente [PGR], que o objetivo
do indulto foi beneficiar determinada classe de condenados”.
Após o voto de Lewandowski e da
interrupção da sessão por 30 minutos, o ministro Luiz Fux anunciou que pediria
vista do processo, isto é, suspenderia a decisão. Os ministros Marco
Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello, então, pediram para adiantar
suas posições.
Em seu voto, também no mesmo
sentido do de Alexandre de Moraes, Marco Aurélio afirmou
que “não há no plenário divisão, entre aqueles que são favoráveis ao combate
desenfreado da corrupção e os que são contra esse combate. Nós somos a favor da
ordem jurídica, da observância irrestrita à ordem jurídica, principalmente a
ordem jurídica constitucional”.
Para o ministro, ao limitar o
decreto de indulto presidencial por meio de uma liminar, Luís Roberto Barroso
“findou por substituir-se ao presidente da República, estabelecendo condições
para estabelecer-se o indulto”.
Marco Aurélio Mello entende que a
o decreto é “ligado à soberania interna do chefe do poder Executivo” e que o
texto editado por Temer não fere o princípio da separação de Poderes. “Li
o decreto e percebi que se trata de uma peça que prima pela razoabilidade, que
estabelece distinção entre primário e reincidente, já que versa a problemática
alusiva a pessoas condenadas por certos crimes e aí exclui o benefício, e
revela condições, portanto, que se mostram aceitáveis socialmente”, decidiu o
ministro.
Ao antecipar seu posicionamento, Gilmar Mendes declarou
que “reescrever” o indulto seria um “hiperativismo” do Supremo. Ele também
sustentou que é o presidente da República a quem cabe editar decretos dessa
natureza e que os mandatários estão submetidos a “custos políticos” das
decisões.
Gilmar ainda classificou como
“irresponsável” a afirmação de membros da Lava Jato, como o procurador da
República Deltan Dellagnol, de que 21 alvos da operação poderiam ser
beneficiados pelo indulto. O ministro apontou que 14 destes nomes são delatores
já livres da prisão.
“Aqui não há os campeões da
defesa da corrupção e os campeões ao combate da corrupção. É preciso que o
combate ao crime tenha que se fazer dentro do devido processo legal e que isso
seja observado. É fácil ver para onde se rumam os abusos e a História está
prenhe, inclusive a História recente, de abusos que se cometem com base no
combate à corrupção”, disse.
Já o decano do Supremo, Celso de Mello,
entende que “o Supremo Tribunal Federal, como o poder Judiciário em geral, não
dispõe de competência para, substituindo o presidente da República, formular
requisitos objetivos ou estabelecer exclusões em relação ao objeto do indulto
presidencial”. [veja / Foto Foto:
Rosinei Coutinho/SCO/STF ]