Beatriz Segall morreu nesta quarta-feira, em São Paulo, aos 92 anos. A atriz foi internada no fim de agosto e chegou a passar uma semana no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Na última semana, a artista voltou a ser hospitalizada. O centro médico confirmou a morte da artista.
Em 2015, Beatriz sofreu uma lesão no no braço, após uma queda no palco durante a apresentação da peça “Nine - Um Musical Feliniano”, em São Paulo. Na ocasião, ela passou por uma cirurgia no membro direito, e teve que ser substituída no espetáculo.
Em 2013, a atriz tropeçou em pedras portuguesas na Gávea, na Zona Sul do Rio, e passou 20 dias de repouso, tratando um hematoma no rosto.
A última participação da atriz na TV foi na série “Os experientes”, também em 2015. Atualmente, a novela "Vale tudo" está sendo reexibida pelo Canal Viva, em comemoração aos 30 anos de seu lançamento. A obra é uma das mais marcantes da carreira da atriz, eternizada no papel da vilã Odete Roitman.
Trabalho recente no teatro
Em 2017, Beatriz Segall gravou um vídeo para o Instagram comentando sobre a leitura para atores. O registro é, provavelmente, a última entrevista da atriz.
Carreira
A atriz e a personagem mais popular que ela interpretou, Odete Roitman, viviam em mundos bem distintos. “[Odete] entrou para a história da televisão brasileira, isso é indiscutível. Agora, eu não sou uma atriz de um papel só, fiz muitas outras coisas, recebi alguns prêmios e não construí minha carreira só com ela”, desabafou Beatriz em 2013, em entrevista à revista ÉPOCA, numa das muitas vezes em que foi requisitada para falar sobre o enorme sucesso que a má, mesquinha, vaidosa e arrogante vilã da novela “Vale tudo” (de 1988, mas várias vezes reprisada) fez.
Na mesma entrevista, ela explicava seu cansaço: “As pessoas que acham que estão sendo originais e soltam a velha pergunta: ‘Quem matou Odete Roitman?’. Ninguém aguenta mais ouvir falar sobre isso. Mas se for uma abordagem bacana sobre a personagem, nunca me nego a falar.”
De vez em quando, porém, como quando falou ao GLOBO, em 1988 (época em que era parada na rua a toda hora por causa da novela), Beatriz revelava até algum carinho pela criação de Gilberto Braga: “A Odete diz coisas que são consideradas impatrióticas, mas que são verdades. Isso provoca alguns tipos de ações ou reações. Parece que todo mundo se envolveu muito com a Odete Roitman.”
Filha de uma família de classe média carioca, que lutou contra a oposição do pai para poder fazer teatro, a professora de francês Beatriz de Toledo estreou profissionalmente nos anos 1950 em “Manequim”, de Henrique Pongetti, ao lado de Jardel Filho, pelo Teatro Popular de Arte (TPA). Depois de integrar a companhia Os Artistas Unidos, da atriz francesa Henriette Morineau, ela recebeu uma bolsa do governo francês para cursar língua e teatro na Sorbonne, em Paris.
Lá, Beatriz conheceu conheceu Maurício Segall, filho do pintor Lasar Segall, com quem se casou em 1954 e teve três filhos: o diretor de cinema Sérgio Toledo (que fez “Vera”, longa de 1986 que valeu a uma estreante Ana Beatriz Nogueira o Urso de Ouro de melhor atriz em Berlim), Mário (arquiteto e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie) e Paulo. Nessa época, a atriz abandonou a carreira artística para retomá-la somente em 1964, quando substituiu Henriette Morineau em “Andorra”, do Teatro Oficina, dirigida por José Celso Martinez Corrêa.
Daí em diante, o teatro se tornou a vida Beatriz Segall, em montagens como “Os inimigos” (1965, de Máximo Gorki, com direção de José Celso, também com o Oficina), “Marta Saré” (1968, de Gianfrancesco Guarnieri, pela companhia de Fernanda Montenegro, com quem dividiu o palco) e o “Hamlet” (1969), de William Shakespeare, dirigido por Flávio Rangel no Teatro Anchieta.
Com Maurício Segall, a atriz capitaneou um processo de reerguimento artístico do Theatro São Pedro, em São Paulo, o que resultou nas montagens “A longa noite de cristal” (1970), de Oduvaldo Vianna Filho, e “O interrogatório” (1971), de Peter Weiss. Em 70, Maurício foi preso e torturado por sua ligação com a ANL, grupo que aderiu á luta armada contra o regime militar.
Com alguns poucos papéis no cinema (onde estreou em 1951, em “A beleza do diabo”, do francês Romain Lesage), Beatriz começou a se destacar na TV (onde teve participações esporádicas) em 1978, ao viver a Celina de “Dancin Days”, de Gilberto Braga. Seguiram-se papéis em “Pai herói” (1979), “Água viva” (1980), “Sol de verão” (1982), “Champagne” (1983), “Carmen” (1987), “Barriga de aluguel” (1990), “De corpo e alma” (1992), “Sonho meu” (1993) e “Anjo mau” (1997). Em 1988, a atriz confidenciava ao GLOBO: “Até fazer ‘Dancin Days’, eu execrava televisão. Achava tudo muito pobre, sem recursos. A partir de ‘Dancin Days’ me dei conta de que não podia mais ignorar o veículo, a TV tinha melhorado muito.”
E se o assunto era teatro, as opiniões de Beatriz Segall ficavam ainda mais fortes. Em 2000, quando estrelava uma montagem de “Histórias roubadas”, do norte-americano Daniel Margulies, ela observava, em entrevista ao GLOBO: “O teatro está abandonado no Brasil. Não há apoio porque o teatro não dá lucro, dá apenas prestígio. Isto exigiria do Ministério da Cultura um olhar mais atento aos nossos problemas. Seria preciso rever a Lei Rouanet, para que ela oferecesse mais vantagens ao patrocínio teatral. O cinema tem a Lei do Audiovisual e o teatro não tem nada. Estamos absolutamente abandonados.”
Em 2002, no segundo turno da eleição presidencial, Beatriz participou do programa de TV do candidato do PSDB José Serra (que disputava com Lula, do PT), dizendo: “Eu tenho medo. Como a Regina Duarte, também estou com medo de não poder dizer que estou com medo. De ser ameaçada de processo pelo simples fato de discordar.” Em 2013, a atriz caiu em um buraco em uma calçada do bairro da Gávea, no Rio, machucando-se seriamente. Na ocasião, ela chegou a receber uma ligação e um pedido de desculpas do prefeito Eduardo Paes.
A última participação de Beatriz Segall na TV foi no primeiro episódio da série “Os experientes”, da TV Globo. Em “Assalto”, ela interpretou Yolanda, uma senhora que se vê no meio de uma ação criminosa em uma agência bancária e que divide sua história com um dos assaltantes.|extra.globo / Foto: Thiago Teixeira/Estadão Conteúdo