Sem dinheiro, prefeituras negativam nome de
devedores de IPTU; pode isso?
Em meio à queda na arrecadação de tributos,
dentre eles o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), prefeituras de
algumas capitais do país resolveram apertar o cerco contra os devedores.
Prazo para negociar
na Bahia termina nesta sexta
Em Alagoinhas, a 108 km de Salvador
(BA), cerca de 1.500 contribuintes dos 72 mil cadastrados no IPTU terão até
esta sexta-feira (10) para tentar negociar pendências e sair da chamada dívida
ativa do município --estimada hoje em R$ 60 milhões.
Dos 30 maiores devedores, 90% são
empresas, calcula a gestão.
Quem procurar a prefeitura até a data
estipulada poderá parcelar os débitos em até 60 meses no boleto ou em até 12
vezes no cartão de crédito.
Segundo a prefeitura, a medida faz
parte de um decreto com base na Lei Federal nº 9.4942/1997. Antes de
implementá-la, o município diz ter disponibilizado um Refis [programa de
refinanciamento de dívidas] desde dezembro de 2017.
Inicialmente, serão protestados os
devedores cujos autos de infração já foram emitidos. Na sequência, será a vez
daqueles que possuem parcelamentos homologados e interrompidos; em seguida, os
demais contribuintes.
Vereadores
contestam negativação
Vereadores de oposição, por sua vez,
contestam a iniciativa sob os seguintes argumentos:
- A administração pública não pode agir como um
ente privado
- Precisaria de um projeto de lei a ser debatido
e aprovado pelo Legislativo
A pedido do UOL , o
advogado Harrison Leite, professor de Direito Tributário e Direito Financeiro
da Ufba (Universidade Federal da Bahia), explica, em cinco tópicos, se
negativar o nome por dívida de imposto é legal ou não, quando ela pode ser
feita e o como o contribuinte deve agir nesses casos.
1) A medida é ou
não legal?
É legal. O STF (Superior Tribunal
Federal), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5135, em 2016,
fixou a tese de que é constitucional o protesto das certidões de dívida ativa.
No passado, muitos tribunais
entenderam que a medida era por demais restritiva de direitos, dado que o
Estado já tinha diversos mecanismos de cobrança dos tributos. Mas, com a
elevada crise de receita pública nos últimos anos, o STF se convenceu de que a
eficiência do protesto ajudaria municípios e estados a melhorar a sua receita.
Daí ser constitucional a medida.
2) Quando a lei
deve ser aplicada?
Ela é aplicada para todos os créditos
de prefeituras e estados inscritos em dívida ativa. Ou seja, em todas as
receitas públicas, seja de tributos (IPTU, ISS, Itiv - transmissão de bens
móveis entre vivos, taxas de funcionamento), multas e aluguéis.
Se essas dívidas não forem pagas
no prazo ou se não estiverem sendo discutidas administrativamente poderão ser
inscritas em dívida ativa. Após a inscrição, geralmente faz-se uma cobrança
amigável e, se mesmo assim o devedor não paga, poderá ser protestado.
Mas a prefeitura tem de ser cautelosa
nesse sentido. É que muitos créditos são inscritos de maneira irregular. Por
exemplo, pode ocorrer de o cadastro imobiliário do IPTU não ser confiável, seja
pelo endereço, seja pelo nome, quando um homônimo deve e outro é negativado;
não há CPF de todos os devedores; o imóvel é alugado e o cadastro está no nome
do inquilino; o imóvel ter isenção ou imunidade.
Enfim, deve haver sempre um controle
rígido para não protestar quem não está devendo, sob risco de o município ter
de indenizar quem foi protestado indevidamente.
3) Além da
negativação no SPC/Serasa, há outras sanções previstas, como a perda do imóvel?
Além do protesto, a prefeitura ajuíza
uma ação de execução fiscal que pode penhorar o imóvel do contribuinte em caso
de dívida de IPTU. Bom lembrar que o único imóvel de uma pessoa é um bem impenhorável.
Se a dívida for de IPTU, a penhora passa a ser possível.
A ação de execução fiscal poderá
também acarretar penhora de conta bancária ou de bloqueio de bens do devedor.
Mas, se for de outros tributos, como
ISS, Itiv, alvarás ou outros, o único bem imóvel é poupado. No entanto, se a
pessoa tem mais de um bem imóvel, este poderá ser perdido.
4) Que juros podem
incidir sobre esse tipo de dívida?
Não há lei nacional que trate dos
juros dos municípios. Alguns seguem os juros dos tributos federais, vinculados
à taxa Selic. Além da Selic, há os juros de mora de 1% ao mês e a multa de
mora, de 0,33% ao dia, limitada a 20%. Mas isso depende de cada legislação
municipal. Em todos os municípios, os valores são altos, dada a elevada
inadimplência.
5) O que o
contribuinte deve fazer? Resta apenas negociar?
Primeiro, o contribuinte deve
acompanhar anualmente a sua relação com o município, pegando certidão negativa
de débito do IPTU e dos demais tributos.
Se for empresário, a maior ocorrência
se dá quando ele encerra a atividade e não vai à prefeitura "dar
baixa" da sua inscrição. Assim, muitas pessoas que encerraram o seu
comércio ficam devendo o alvará (taxa de fiscalização) simplesmente porque
nunca foram ao setor pedir a baixa da sua inscrição.
Outros venderam o imóvel e não foram
ao setor alterar o cadastro, passando imóvel para o novo titular. Havendo o
protesto, e não sendo por erro da prefeitura, aí não há jeito: tem de negociar.
Olinda (PE), Campina Grande (PB) e Porto Alegre (RS), por
exemplo, estão entre as capitais que passaram a adotar como medida
"extrema" a negativação de milhares de cidadãos devedores em órgãos
de proteção ao crédito, como SPC e Serasa.