Chegou ao fim neste
fim de semana, depois de 26 dias, a greve de fome que sete pessoas fizeram como
forma de pedir a liberdade do ex-presidente Lula, candidato do PT à sucessão de Michel Temer
(MDB) e preso desde 7 de abril em Curitiba (PR). Depois de quase um mês sem
comer, em ato que começou em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), o grupo
já começava a apresentar sinais preocupantes de saúde. Um deles teve que ser
levado a um hospital de Brasília.
Eles
estavam mobilizados desde 31 de julho. Durante o período de greve de fome, os
ativistas Jaime Amorim, Zonália Santos, Rafaela Alves, Frei Sérgio Görgen, Gegê
Gonzaga, Vilmar Pacífico e Leonardo Soares foram recebidos por quatro ministros
do STF. Rosa Weber e Ricardo Lewandowski os receberam pessoalmente, mas os
ativistas também foram recebidos nos gabinetes de Gilmar Mendes e Luís Roberto
Barroso, relator das ações que pedem a impugnação da candidatura de Lula no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo
os ativistas, a greve de fome teve como propósitos mobilizar o povo em relação
aos direitos de Lula, além de provocar debate do assunto junto à mais alta
instância do Judiciário e reforçar a importância da vontade popular em um
Estado democrático de direito. Eles receberam uma carta de agradecimento de
Lula na última sexta-feira (24) e disseram ter alcançado o objetivo de
denunciar o "golpe" do impeachment de Dilma Rousseff, agora candidata
do PT ao Senado, e alegada "prisão sem provas" do ex-presidente.
Em texto divulgado
ao final da greve de fome (leia carta abaixo), os sete ativistas dizem ter
acolhido "chamado de suas organizações para retornar às bases e fomentar
com o potencial simbólico do ato praticado a luta popular". Eles explicam
ainda que o ato que encerra a greve de fome, realizado em um auditório
do Centro Cultural de Brasília (CCB), não representa o final da jornada de
reivindicações. "Ao contrário, é uma nova etapa que começa",
sintetiza Jairo Amorim, que se pronunciou em nome do grupo.
"Nos
acompanharam quatro médicos fantásticos e uma cuidadosa equipe de saúde, que
soube ouvir atentamente os nossos corações e os dilemas de nossas mentes.
Tivemos o acompanhamento permanente de diversos dirigentes de nossos
movimentos, que nos deram literalmente o braço e o ombro amigo", diz carta
divulgada pelo grupo.
Leia a íntegra:
CARTA DE AGRADECIMENTO POR TODA SOLIDARIEDADE
RECEBIDA NA GREVE DE FOME POR JUSTIÇA NO STF
Creio no direito à
solidariedade e no dever de ser solidário. Creio que não há nenhuma
incompatibilidade entre a firmeza dos valores próprios e o respeito pelos
valores alheios. Somos todos feitos da mesma carne sofrente. Mas também creio
que ainda nos falta muito para chegarmos a ser verdadeiramente humanos.
José Saramago
Companheiros e companheiras
Estamos terminando uma greve de fome de 26 dias,
saciados pelo legado de luta e resistência do nosso povo. Nestes dias nos
colocamos em combate numa ação dura, mas com muita convicção da importância de
enfrentar o golpe em curso e as graves consequências da profunda crise
existente na sociedade brasileira que atinge principalmente a vida e a casa dos
mais pobres. E neste contexto, compreendemos que a luta pela liberdade de Lula
representa a luta pela liberdade do próprio povo e por justiça no judiciário,
especialmente no STF.
Fizemos a greve como uma tarefa militante, a partir
da definição política de nossos movimentos e organizações, inspirados no
exemplo revolucionário de resistência ativa, pacífica e nem um pouco passiva.
Mas no decorrer do processo, para além da tarefa militante, fomos compreendendo
de diversas formas o sentido da solidariedade comprometida que nos irmana nesta
grande luta. Vocês não imaginam o que foi experimentar e conviver nesses dias
todos, com tantas manifestações solidárias de um profundo humanismo.
Nos acompanharam quatro médicos fantásticos e uma
cuidadosa equipe de saúde, que soube ouvir atentamente os nossos corações e os
dilemas de nossas mentes. Tivemos o acompanhamento permanente de diversos
dirigentes de nossos movimentos, que nos deram literalmente o braço e o ombro
amigo.
Recebemos cartas e mensagens de diversas cidades do
Brasil e do mundo, com manifestações de apoio por parte de organizações
políticas, mas também de muitas pessoas que individualmente se solidarizavam
com a causa e o gesto da greve de fome. Dentre as cartas, recebemos uma
mensagem nominal, expressando orgulho e admiração, escrita com o próprio punho
do presidente Lula, em solidariedade à nossa ação política.
Durante todos os dias recebemos visitas, que nos
demonstravam de forma companheira que ninguém ali estava só. Foram horas e
horas de diálogo sobre a realidade brasileira e as potencialidades da
construção de um país soberano e popular. Aprendemos muito com esse “entra e
sai” de gente convicta e persistente, que nas batalhas cotidianas mostram o
quanto estamos do lado certo da história, provando que é possível derrotar o
poder da força bruta, de bota, de toga ou do que for. Gente como como a
Caravana do Povo do Semiárido, que saiu de Caetés, foi até Curitiba e depois
passou por aqui, para nos abraçar.
Recebemos a visita de pastores e líderes de todas as
religiões e crenças de nosso povo. Participamos das vigílias e atos
inter-religiosos em frente aos tribunais e casas de ministros do STF. Estes
atos nos enchiam de energia, para seguir a luta.
Fomos acolhidos com carinho e coragem pelos irmãos
jesuítas no CCB (Centro Cultural de Brasília). A vocês todo nosso carinho e
gratidão.
Também recebemos a honrosa visita do Prêmio Nobel da
Paz, conquistado por uma vida inteira de luta pelos direitos humanos, que veio
da Argentina para nos visitar, nosso querido Adolfo Perez Esquivel.
E como não citar Leonardo Boff, e sua voz reflexiva
e sábia, que nos deu muita esperança de que o Brasil tem jeito e que um dia o
povo assumirá o poder.
Recebemos ainda a visita dos candidatos Fernando
Haddad e Manuela D’ávila, além de diversos parlamentares que fizeram questão de
nos ouvir e se solidarizar.
Fundamental destacar também nosso reconhecimento à
solidariedade recebida por parte da comunidade artística, seja pelo envio de
vídeos que circularam nos nossos meios de comunicação popular e também pela
calorosa visita de Osmar Prado, Chico César, Tuca, Luís Fernando Lobo, Zé
Mulato e Cassiano, entre outros.
Vibramos com entusiasmo ao ver as mobilizações de
solidariedade à greve de fome se multiplicarem nos estados, nas capitais e em
várias cidades do interior, nos atos inter-religiosos e vigílias em frente aos
tribunais deste país. A cada nova mobilização, víamos a importância de manter
uma chama de resistência sempre acesa, para incendiar o desejo das
transformações sociais que tanto necessitamos.
Nunca devemos desanimar. Quem trabalha na
organização do povo, não tem o direito de ser pessimista.
Da nossa parte, podem contar sempre conosco, em
todas as trincheiras, e se preciso for, saibam todos e todas que ainda podemos
voltar a fazer greve de fome, e agora com mais experiência, certamente
ficaremos ainda mais dias.
Um forte e fraterno abraço a cada militante e
lutador, lutadora de nosso povo brasileiro, que atuam nos mais diferentes
espaços sociais, das igrejas, escolas, moradias, fábricas, campo, nas praças e
nas ruas.
Brasília, 25 de agosto de 2018.
Jaime Amorim, Zonália Santos, Rafaela Alves, Frei
Sergio Görgen, Luiz Gonzaga Silva – Gegê, Vilmar Pacífico e Leonardo Nunes
Soares.
[Informações do congressoemfoco / Foto reprodução]