O gênio nasce gênio, não é ensinado. Neymar é um desses
personagens cujo dom se manifesta desde a primeira mamada. Veio ao mundo com
aquele raro talento que faz os craques convencionais parecerem penas-de-pau.
Para ele, o drible é fácil, a classe é natural. O gol, uma rotina. É assim
desde as divisões de base do Santos. Pois bem. De um gênio espera-se
genialidade, não choramingos.
Uma
das características do gênio genuíno é que ele jamais se deixa estragar pelo
sucesso. O êxito de Neymar é tão retumbante que acostumou mal o brasileiro. O
sujeito senta na arquibancada ou defronte da tevê na expectativa de que o gênio
faça com os pés o que Michelangelo fazia com as mãos: arte. Quando ela não vem,
a decepção é brutal e automática. A crítica, inevitável.
Normalmente
tratado pela imprensa esportiva a pão-de-ló, o gênio abespinhou-se com os
reparos feitos à sua má atuação nas primeiras partidas da Copa. Neymar anotou
no Twitter: “Nem todos sabem o que passei pra chegar até aqui, falar até
papagaio fala, agora fazer…”
O
gênio ainda não se deu conta, talvez por causa do excesso de juventude. Mas
jogador de futebol que reclama das críticas é como capitão de navio que se
queixa da existência do mar. Uma coisa não existe sem a outra.
“O
choro é de alegria, de superação, de garra”, escreveu Neymar. “Na minha vida as
coisas nunca foram fáceis, não seria agora né! O sonho continua, sonho não,
OBJETIVO!” Ficou entendido que a diferença entre a genialidade e a mediocridade
é que a genialidade tem limites.
Gente
com vida difícil existe em cada esquina. Mas só o gênio possui salário com peso
de ouro, residência em Paris, mansão em Angra, carrões na garangem, avião no
hangar e namorada deslumbrante. Nessas condições, o choro é dispensável e a
superação é inevitável. A garra, um imperativo lógico.
O
ilógico é jogar mal e não conseguir marcar um gol em 90 minutos de jogo,
esticando o martírio até a prorrogação. O gênio revela-se capaz de tudo, menos
de exibir os sintomas da dor de consciência.
Para
Neymar, o papaio fala porque falar é mais fácil do que fazer. Verdade. Mas um
papagaio que fosse remunerado e tratado como gênio talvez ficasse com um
insuportável sentimento de culpa se não pintasse uma Capela Sistina a cada
partida. Por sorte, ainda há diante do gênio uma Copa por conquistar. O que
leva ao título é o gol, não o choramingo. [josiasdesouza / Foto reprodução]