Eis que, depois do golpe assestado, com Lula condenado a 12
anos e um mês de prisão e já tornado inelegível pela decisão do TRF-4, o STF
faz circular a informação de que pode rever sua própria decisão de 2016, que
autoriza a prisão a partir da condenação em segunda instância, tal como já
determinado pelo relator de Porto Alegre. Paira porém uma pergunta: o que
move o STF, a quem mesmo quer salvar e com que objetivo, quando cogita de uma
medida que pode ser assim resumida: “agora que ele não pode mais ser candidato,
evitemos os aborrecimentos que viriam com uma prisão imediata”. O
que está chegando ao STF não é o clamor contra a condenação de Lula. É o temor
de seus algozes quanto ao que virá depois.
Em 2016 um plenário dividido do Supremo decidiu por 6 a 5 votos a
favor das prisões a partir da condenação em segunda instância,
embora a Constituição seja clara como água ao estabelecer a garantia de
liberdade até o completo trânsito em julgado, vale dizer, até o esgotamento de
todos os recursos. Gilmar Mendes votou a favor mas se arrependeu e vem
defendendo a revisão. Rosa Weber, por outro lado, votou contra mas seria a
favor da manutenção da medida. Se esta recaída “garantista” do Supremo
acontecer, será vista como uma boia de salvação para Lula, embora a corte
nada tenha feito, quando era tempo, para colocar freios no “pode tudo” do braço
judiciário da Lava Jato. Hoje está claro que Sergio Moro não é um arauto
solitário mas articulado com seus pares em outras jurisdições, a exemplo de
Bretas no Rio, dos desembargadores do TRF-4 e do juiz Ricardo Leite, da 10ª.
Vara de Brasília (que confiscou o passaporte de Lula).
Há alguns meses poderia o STF ter feito a revisão do excesso
cometido sob o calor e as cobranças da inquisição. Foi
postergando. Neste momento a vítima dela será Lula mas,
daqui a pouco, poderá ser outro nome do sistema político, alguém do
“outro lado”, pois algum contrapeso poderá ser jogado ao mar para
atenuar a percepção da perseguição e de seu objetivo fundamental, que não é
prender Lula, é impedir que ele seja candidato e se eleja. Será
desgastante para o STF mas pode ser pior se a corte tiver que tomar a medida
mais adiante, para beneficiar diretamente alguém do bloco vitorioso, no qual
não faltam investigados, a começar do próprio presidente da República. O
ministro da Justiça, Torquato Jardim, verbalizou em nome do governo o desejo de
que haja a revisão. Os políticos do bloco golpista, calados, torcem para que
isso aconteça. Afinal, nenhum tucanos será preso mesmo mas podem sobrar
estilhaços para o PMDB e outros partidos, afora os que já foram alcançados.
A revogação agora, além de tudo, soará como uma espécie de
conciliação, uma quase “caridade” do sistema para com Lula. Decretada a prisão
dele já está e não faltaram advogados e juristas prevendo hoje que os embargos
declaratórios serão julgados em tempo curtíssimo pela trinca de Porto Alegre.
Eles não poderão mudar a sentença mas apenas corrigir, se aceitos, alguns aspectos
adjetivos dela. Revendo sua decisão, e evitando a prisão agora, o Supremo
contribuirá para evitar uma escalada imprevisível da radicalização política e
reduzirá os dados à própria imagem do Judiciário, que se é aplaudido
aqui, pela mídia associado ao plano em marcha, vem escandalizando pelo
menos consciências estrangeiras. E, o mais importante, remove-se, em nome de
Lula, a decisão que ameaça investigados e réus do condomínio da direita.
O destino pessoal de Lula, adiante se verá, depois do trânsito em
julgado, até porque outras condenações agora estão a caminho. O
fundamental, a inabilitação, o Judiciário garantiu. Esta parece ser a
lógica que moverá o Supremo, caso se mova mesmo. Não por Lula mas pelo próprio
sistema.| Tereza Cruvinel, colunista do 247