O
Supremo Tribunal Federal revogou nesta terça-feira, 2, o decreto de prisão
preventiva que pesava contra o ex-ministro chefe da Casa Civil José Dirceu
(Governo Lula). Por três votos a dois, os ministros da Segunda Turma da Corte
máxima decidiram abrir os portões da prisão da Lava Jato para o emblemático
personagem petista.
Ao mesmo tempo em que concederam
liberdade, os ministros da Segunda Turma do STF atribuíram ao juiz federal
Sérgio Moro definir as medidas cautelares que serão impostas ao petista.
Votaram pela
liberdade de José Dirceu, os ministros Gilmar Mendes, voto decisivo, Dias
Toffoli e Ricardo Lewandowski.
Contra a revogação da
prisão, os ministros Celso de Mello e Edson Fachin, relator da Lava Jato no
Supremo.
“Este é um caso
complexo e triste da nossa própria história. Não podemos nos ater à aparente
vilania dos envolvidos para decidir acerca da prisão processual. E isso remete
à própria função da jurisdição em geral, da Suprema Corte em particular. A
missão de um tribunal como o Supremo é aplicar a Constituição, ainda que contra
a opinião majoritária”, disse Gilmar Mendes, que defendeu a importância do uso
do habeas corpus.
Dirceu estava preso
desde 3 de agosto de 2015, por ordem do juiz federal Sérgio Moro, símbolo da
Lava Jato. Em menos de dois anos, Moro aplicou ao ex-ministro duas pesadas
condenações que somam 32 anos e um mês de prisão por corrupção, lavagem de
dinheiro e associação criminosa.
Em seu voto, Toffoli
afirmou que a manutenção da prisão preventiva após condenação em primeira instância
significaria modificar a jurisprudência do Supremo, que prevê que a execução de
uma pena deve começar apenas após a condenação em segundo grau.
“A prisão preventiva
não pode ser utilizada como um instrumento antecipado de punição”, afirmou
Toffoli, que junto com Gilmar Mendes já havia votado, na semana passada, pela
liberdade do pecuarista José Carlos Bumlai e do ex-assessor do PP João Cláudio
Genu.
A favor da manutenção
da prisão preventiva, o relator, ministro Edson Fachin, alegou que medida “encontra-se
plenamente justificada pela lei e pela jurisprudência desta Corte, inclusive
desta Segunda Turma”. “Estamos, aqui, a tratar da criminalidade do colarinho
branco”, disse Fachin.
Fachin destacou que,
embora diversas prisões tenham sido alvo de críticas em razão de seu alcance no
tempo, “o tema merece ser compreendido de modo cuidadoso”.
“No caso concreto, o
paciente encontra-se preso provisoriamente desde 3 de agosto de 2015, situação
que certamente não é indiferente ao Estado Juiz. Contudo, eventual excesso na
duração das prisões cautelares não deve ser analisado mediante prazos
estanques. Não se trata de avaliação meramente aritmética. Indispensável, na
realidade, que tal circunstância seja aferida de modo particularizado, à luz
das peculiaridades de cada caso”, ressaltou Fachin, em um trecho de seu voto
que foi posteriormente citado por Celso de Mello.
No início do ano,
Fachin negou seguimento ao habeas corpus apresentado pela defesa do petista.
Para o relator da Lava Jato no STF, não estavam presentes os requisitos mínimos
para decidir sobre o pedido de liberdade do ex-ministro.
Fachin considerou
ainda que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região não analisou a decisão que
manteve a prisão de Dirceu após sua condenação pela Justiça de primeiro grau e
o STF cometeria uma “indevida supressão de instância” se analisasse o pedido de
liberdade.
No entanto, a defesa
de Dirceu recorreu da decisão do ministro e a 2ª Turma do STF decidiu que o
habeas corpus deveria ser analisado. “Não se pode atribuir ao paciente a demora
em seu julgamento nem negar-lhe de utilizar dos meios de defesa que a
Constituição e as leis lhe asseguram”, disse o ministro Ricardo Lewandowski.
“Não se podendo impor
ao paciente que aguarde preso indefinidamente eventual condenação no segundo
grau. A prisão acaba representando uma punição antecipada, sem uma condenação
em segundo grau”, destacou Lewandowski.
Para Lewandowski, o
que se está vendo é “é prisões a partir de uma decisão de primeiro grau”. “Isso
evidentemente é vedado no nosso ordenamento jurídico constitucional e vedado em
qualquer país civilizado”, criticou.
Toffoli reconheceu a
gravidade dos delitos pelos quais Dirceu foi condenado em Curitiba, mas disse
não haver novos argumentos que justifiquem a continuidade da prisão preventiva
do ex-ministro do PT. Outro argumento que utilizou foi que o grupo ao qual
Dirceu fazia parte já não se encontra no poder após o impeachment da presidente
Dilma Rousseff.
“Entendendo que não
há contemporaneidade e atualidade entre a dita reiteração delituosa com a
decisão que estabeleceu a prisão preventiva e que não estão mais presentes
razões processuais e de ordem pública que justifiquem a prisão preventiva, ela
nada mais é hoje do que a antecipação de uma decisão definitiva, e há inúmeros
casos em que as apelações são providas (garantidas) pelos tribunais”, afirmou
Toffoli, fazendo ressalvas de que não “não se está a julgar o caso concreto,
nem a apelação em si, mas a necessidade de fundamentos para a prisão cautelar
do paciente”.
COLEGIADO. Na semana passada, a 2ª Turma do
STF soltou dois presos da Operação Lava Jato, também apesar do voto contrário
do relator do caso na Corte, ministro Luiz Edson Fachin. O pecuarista José
Carlos Bumlai e o ex-tesoureiro do PP João Cláudio Genu tiveram prisões preventivas
revogadas com decisão da maioria do colegiado.
Na sexta-feira, 28,
em decisão isolada, o ministro Gilmar Mendes mandou soltar o empresário Eike
Batista.
Nesta terça, logo
cedo, a força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba, base da Lava Jato,
entregou à Justiça Federal uma nova denúncia, a terceira, contra o ex-ministro
da Casa Civil – agora, acusado pela prática de 33 crimes de lavagem de
dinheiro, no caso R$ 2,4 milhões que teria recebido em propinas
das empreiteiras Engevix e UCT Engenharia.
A nova denúncia foi
uma tentativa derradeira da Procuradoria de convencer o Supremo da necessidade
de manutenção da prisão preventiva de Zé Dirceu. Não deu certo.
Sobre a nova denúncia
do Ministério Público Federal do Paraná, Gilmar Mendes disse antes da sessão
que isto não teria influência no julgamento. “Se eles imaginam que vão
constranger o Supremo, o Supremo deixava de ser o Supremo”, disse Gilmar
Mendes, ao chegar para a sessão da Segunda Turma. “Como se a gente pudesse (ser
pressionado)… é o rabo abanando o cachorro.”|estadao