Brasil - Mesmo antes do fim do recesso do Judiciário, que vai até 31 de janeiro,
a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, avalia chamar
para si a responsabilidade de homologar as delações premiadas dos executivos da
empreiteira Odebrecht, que estão em fase final no gabinete do ministro Teori
Zavascki. A delação integra a Operação Lava-Jato e põe na lista de investigados
cerca de 120 políticos, com mandato no Congresso ou com vaga na Esplanada dos
Ministérios.
A possibilidade de
Cármen avocar para si a homologação, antecipada no sábado pelo colunista Merval
Pereira, levará em conta a gravidade e a excepcionalidade do momento. O regimento
interno do STF lista que, entre as atribuições da presidente do tribunal, está
“decidir questões urgentes nos períodos de recesso ou de férias”. A partir de
1º de fevereiro, com a corte voltando a funcionar plenamente, essa
possibilidade já não existe mais. Não há previsão legal de que a presidente do
tribunal possa avocar para si esta tarefa.
De volta a Brasília na segunda-feira, o roteiro de Cármen Lúcia será: estudar, refletir e conversar para tomar essa decisão. A ministra também precisará decidir sobre a escolha do novo relator dos processos da Lava-Jato. O caminho da presidente do Supremo será inspirado no regimento, mas ela enxerga alternativas, já que a lei deve ser interpretada.
Os documentos das
delações da Odebrecht que estavam sendo analisados pelos juízes auxiliares
sairão do gabinete de Teori e serão devolvidos à sala-cofre do tribunal. Mesmo
no recesso, eles vinham atuando em regime de esforço concentrado, analisando os
documentos e cerca de 800 depoimentos de 77 executivos e ex-executivos da
Odebrecht.
Havia a
expectativa de que a decisão de homologar ou não as delações seria tomada em
fevereiro pelo ministro Teori. Os delatores seriam ouvidos para comprovar que
decidiram colaborar sem coações e assistidos por advogados. Com a morte de
Teori, a relatoria fica indefinida e, portanto, os servidores não poderão
continuar examinando o material.
Ainda não houve
julgamentos condenando ou absolvendo réus da Lava-Jato no STF. Por enquanto, o
tribunal tem analisado pedidos de liberdade de réus presos e denúncias do MPF.
Nos dois casos, os investigados têm levado desvantagem. O ministro Teori
Zavascki tinha o costume de manter prisões determinadas pelo juiz Sérgio Moro,
da 13ª Vara Federal de Curitiba, que conduz as investigações na primeira
instância.
Juízes e
advogados que foram ontem ao velório do ministro Teori Zavascki em Porto Alegre
defenderam que a relatoria dos processos da Lava-Jato seja distribuída entre os
demais ministros por meio de sorteio eletrônico. Os ministros do Supremo
evitaram tocar no assunto. Presidente da Corte, Cármen Lúcia não deu
declarações à imprensa.
— Não há nada decidido nesse momento. O regimento tem as previsões necessárias
para essas hipóteses e isso será objeto de análise. Nesse momento, vamos falar
apenas do querido amigo e colega Teori. É momento de luto e tristeza. As
questões institucionais serão resolvidas num momento oportuno — afirmou o
ministro Ricardo Lewandowski.
ministro do stj defende possibilidade Edson Fachin também disse que não era momento
de falar sobre o substituto.
— Estamos aqui com o olhar e o coração
voltados para o presente, que é da perda de um amigo. É um momento de prestar
respeito a essa circunstância e prestar homenagem ao ministro Teori. Das
circunstâncias que decorrem dessa vacância, o Tribunal se encarregará dela o
mais breve possível — declarou Fachin.
Para o ministro do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) Paulo de Tarso Sanseverino, Cármen Lucia homologar a delação
seria uma decisão “acertada”. Segundo ele, o regimento do Supremo permite
várias interpretações para a redistribuição dos processos da Lava-Jato, embora acredite
que o melhor seria o sorteio entre os demais ministros.
— Cármen Lúcia assinar as homologações seria
acertado. Sobre a relatoria dos casos, acho que não se deve deixar a repara o
ministro que for assumir. Seria uma situação política extremamente delicada ele
ter que participar da sabatina no Senado — disse Sanseverino.
Gilmar Mendes, como Cármen, não deu
declarações à imprensa.
Rubens Glezer, professor de direito
constitucional da FGV-SP, diz a que ministra Carmen Lúcia poderia perfeitamente
homologar as delações ainda pendentes, como a da Odebrecht. Para isso, diz,
bastaria que o Ministério Público Federal (MPF) se manifestasse junto ao
Supremo pela urgência da homologação.
— Nesse caso ela poderia deliberar sobre a
homologação e depois redistribuir o processo — diz Glezer, observando que pelo
regimento da Corte a ministra não pode ser a relatora do processo.
Para o professor de Direito Constitucional do
Mackenzie Antonio Carlos Rodrigues do Amaral, um atraso no processo da
Lava-Jato no Supremo é quase inevitável. Mas algumas medidas poderiam evitar
que ele fosse muito grande, como o novo ministro relator aceitar trabalhar com
a equipe montada pelo então ministro Teori Zavascki.
— O principal é o ponto de vista prático da
estruturação da administração do processo. Se o ministro que escolhido relator
decidir que vai montar uma nova equipe para esse trabalho aí poderemos ter um
atraso de quatro, seis meses. Mas se o novo relator aceitar trabalhar com os
assessores que estavam com Teori, o atraso pode ser bastante reduzido — avaliou
Amaral.|oglobo