Em
depoimentos da delação premiada, Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro,
disse que distribuiu mais de R$ 70 milhões em propina de contratos da estatal
para o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o senador Romero Jucá
(PMDB-RR), e o ex-senador José Sarney (PMDB-AP), entre outros líderes do PMDB.
Segundo Machado, o valor mais expressivo, de R$ 30 milhões, foi destinado a
Renan, o principal responsável pela indicação dele para a presidência da
Transpetro, subsidiária da Petrobras e maior empresa de transporte de
combustível do país.
Machado
disse ainda que repassou aproximadamente R$ 20 milhões para Sarney durante o
período que esteve à frente da estatal. Romero Jucá, que ficou uma semana como
ministro do Planejamento do governo Michel Temer, também recebeu
aproximadamente R$ 20 milhões. Machado fala sobre altas somas em propinas com
autoridade. A partir do acordo de delação, ele próprio se comprometeu a
devolver aproximadamente R$ 100 milhões, fortuna acumulada com desvios de
contratos entre grandes empresas e a Transpetro.
Machado disse
que abasteceu também as contas dos senadores Edison Lobão (PMDB-MA) e Jader
Barbalho (PMDB-PR). As acusações são consideradas devastadoras porque Machado
indicou os contratos fraudados e os caminhos percorridos pelo dinheiro até
chegar aos parlamentares. Relatou que o dinheiro era desviado de contratos
firmados entre a Transpetro e grandes empresas. O esquema funcionou durante
todo o período que ele esteve à frente da Transpetro, de 2003 até o ano
passado.
A estrutura
de arrecadação de propina e lavagem de dinheiro seguiu os padrões tradicionais.
Os recursos passavam por várias pessoas até chegar ao políticos mencionados por
Machado. Em alguns casos, a propina foi entregue diretamente ao interessado.
Machado deixou claro, ainda, que o dinheiro era para custear campanhas
eleitorais e para pagar despesas pessoais. O ex-presidente da Transpetro disse
que arrecadava e repassava a propina porque achava ser esta a missão dele, ou
seja, garantir retorno financeiro ao grupo político responsável pela
sustentação dele à frente da estatal.
Renan
indicou Machado para a presidência da Transpetro em 2003, no início do primeiro
mandato do ex-presidente Lula, e o manteve apoio à permanência dele no cargo
até ano passado, mesmo depois de ter sido acusado por Paulo Roberto Costa,
ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, de receber propina.
A indicação
teria ainda apoio de Jucá, Sarney e Lobão, entre outros líderes do PMDB. A
combinação dos grampos feitos por Machado com os depoimentos dele e do filho,
Expedito Machado, deixa Renan, Sarney e Jucá em situação extremamente delicada.
Nas
conversas gravadas por Machado, Renan, Jucá e Sarney aparecem discutindo meios
de barrar as investigações da Operação Lava-Jato. Num dos diálogos, Renan
defende mudança na lei para dificultar delações premiadas. Jucá fala no
impeachment de Dilma Rousseff como uma forma de “estancar a sangria” da
Lava-Jato. Sarney sugere a escalação dos advogados César Asfor Rocha,
ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça, e Eduardo Ferrão para conversar
com o ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal
(STF).
RENAN E
JUCÁ RESPONDEM A INQUÉRITOS
As
gravações já resultaram na demissão de Jucá do Ministério do Planejamento e de
Fabiano Silveira, do Ministério da Transparência. Numa das conversas, também
gravadas por Machado, Fabiano Silveira foi flagrado orientado Renan a sonegar
informações e, com isso, atrapalhar o andamento da Lava-Jato. Renan e Jucá já
são alvos de inquéritos abertos desde a primeira fase da operação. Machado decidiu
fazer acordo de delação depois que o dono de uma empreiteira indicou uma conta
usada por ele para movimentar dinheiro de propina. A conta, aberta num banco na
Suíça, era administrada por Expedito Machado, que vivia em Londres.
Expedito
também fez acordo de delação e confirmou boa parte das declarações do pai sobre
a movimentação da propina. O nome de Machado apareceu já na primeira fase da
Lava-Jato. Paulo Roberto Costa, o primeiro delator, disse que o ex-presidente
da Transpetro recebia dinheiro desviado dos cofres públicos. Ele próprio,
Costa, disse ter entregado R$ 500 mil em espécie na casa de Machado.
Mesmo
diante da acusação, Machado se manteve no cargo até fevereiro de 2015, em clara
demonstração de força política. Ao deixar a estatal, resistiu às investigações.
Só mudou de ideia e decidiu colaborar depois que o filho Expedito entrou na
mira do Ministério Público Federal.
Sem saída,
Machado passou a gravar conversas com seus antigos aliados. Logo depois de
gravar alguns de seus principais interlocutores, ele fechou acordo de delação
com o MPF. Os acordos de Machado e do filho foram homologados por Teori na
semana passada. A partir de agora, a Procuradoria-Geral da República deverá
aprofundar as investigações sobre cada acusação do ex-presidente da Transpetro.
Procurado
pelo GLOBO, Renan negou que tenha recebido dinheiro de Machado: “Jamais recebi
vantagens de ninguém e sempre tive com Sérgio Machado relação respeitosa e de
estado”, disse o senador, segundo um de seus assessores. Renan também disse que
“nunca indicou ninguém para a Petrobras ou para o setor elétrico”. O GLOBO
tentou, sem sucesso, falar com Antônio Carlos de Almeida Castro, advogado de
Sarney e Lobão. Em nota, Juca disse que “nega o recebimento de qualquer recurso
financeiro por meio de Sérgio Machado ou comissões referentes a contratos
realizados pela Transpetro”.|oglobo