Em delação premiada à Procuradoria-Geral da
República, o empresário Ricardo Pernambuco Júnior, da Carioca Engenharia,
entregou aos investigadores uma tabela que aponta para a realização de uma
série de depósitos de propinas supostamente pagas ao presidente
da Câmara entre 2011 e 2014.
Segundo o empreiteiro, empresas relacionadas
às obras do Porto Maravilha, no Rio, deveriam pagar R$ 52 milhões ou 1,5% do
valor total dos Certificados de Potencial de Área Construtiva (Cepac) a Cunha.
A parte que caberia à Carioca era de R$ 13 milhões.
O maior repasse ocorreu em 26 de agosto de
2013, no valor de US$ 391 mil, depositados em conta do peemedebista no banco
suíço Julius Baer. Em 2011 foram quatro depósitos que somavam US$ 1,12 milhão.
Em 2012, Cunha recebeu, só dessa fonte, outros US$ 1,34 milhão, divididos em
seis depósitos.
A tabela revela que, em 2013, o deputado –
que ainda não exercia a presidência da Casa – foi contemplado com mais seis
transferências bancárias, totalizando US$ 1,409 milhão. Já em 2014, Cunha recebeu
outras seis parcelas que somavam US$ 804 mil.
A tabela com o caminho das propinas é
dividida em duas partes. "Em relação à primeira parte, é certo
que o montante de US$ 3.984.297,05 foi destinado a contas apontadas
pela deputado Eduardo Cunha; em relação à segunda parte da tabela, que
soma US$ 696 mil, é altíssima a probabilidade de que o valor também tenha
sido destinado a contas indicadas pelo presidente da Câmara, por todo o
trabalho investigativo que fizeram e, principalmente, porque não fizeram
pagamentos deste tipo a outras pessoas", afirmou o empresário.
"Em nenhum momento Eduardo Cunha disse
que as contas eram de sua titularidade, mas é certo que todas estas contas
foram indicadas pelo deputado; que tampouco o depoente chegou a perguntar a Cunha
sobre o titular das referidas contas."
Em 14 páginas, o empresário narra com
detalhes encontro com o presidente da Câmara para combinar como seriam
realizados pagamentos em contas no exterior. Ele descreveu, por exemplo, uma
reunião no Hotel Sofitel de Copacabana que teria ocorrido entre junho
e julho de 2011, época da aquisição das Cepac's pelo Fundo de Investimento do
FGTS.
"O depoente não estava presente, mas seu
pai e um executivo da Carioca chamado Marcelo Macedo estiveram nesta
reunião; ao final do encontro, o depoente foi chamado pelo seu pai, que lhe
alertou que Léo Pinheiro, da OAS, e Benedicto Junior, da Odebrecht, na
reunião do Hotel Sofitel, comunicaram que havia uma solicitação e um
'compromisso' com o deputado Eduardo Cunha, em razão da aquisição, pela
FI-FGTS, da totalidade das Cepacs", declarou.
O empreiteiro detalhou: "O valor
destinado a Eduardo Cunha seria de 1,5% do valor total das Cepac's, o que daria
em tomo de R$ 52 milhões devidos pelo consórcio, sendo R$ 13 milhões a cota
parte da Carioca; este valor deveria ser pago a Eduardo Cunha em 36 parcelas
mensais; e seu pai disse ao depoente que cada uma das empresas 'assumiria'
a sua parte diretamente com Eduardo Cunha."
À Procuradoria, o delator contou que o
primeiro pagamento no Israel Discount Bank para Cunha ocorreu em 10 de agosto
de 2011, no valor de US$ 220.777,00. Pernambuco Júnior relatou que houve uma
dificuldade do Banco de seu pai para efetuar a transferência, em razão do banco
destinatário.
Segundo o delator, Marcelo Macedo não
participou especificamente da conversa entre ele, seu pai e os representantes
da OAS e da Odebrecht. Pernambuco disse que a Carioca, na época, não tinha
contato com Eduardo Cunha. O empreiteiro afirmou que ele e seu pai foram apenas
"comunicados" pela Odebrecht e pela OAS sobre o
"compromisso".
O delator ainda contou aos procuradores da
Lava Jato que entrou em contato com Cunha para marcar uma primeira
reunião. Pernambuco Júnior disse não se recordar se o encontro se deu no
escritório político do deputado, no centro do Rio, ou na Câmara, em Brasília,
"mas acredita que tenha sido no escritório político", em agosto de
2011.
De acordo com Pernambuco Júnior, durante a
reunião, ele perguntou sobre o "compromisso" estabelecido e,
inclusive, sobre o valor, que foi confirmado por Eduardo Cunha'. O empresário
disse que ele e o pai não queriam que o dinheiro passasse "por dentro da
empresa", para ser o mais reservado possível.
O delator contou que questionou o presidente
da Câmara sobre a possibilidade de estes pagamentos serem feitos em contas
no exterior. "Eduardo Cunha disse que não haveria problema nenhum e,
neste momento, ele indicou a primeira conta em que deveria ser efetivado o
pagamento", relatou Pernambuco.
O empreiteiro disse que a reunião deve ter
durado cerca de 30 minutos, 'oportunidade em que se conheceram melhor'.
Pernambuco Júnior afirmou que 'até então não se conheciam ou ao menos não se
recorda de tê-lo conhecido pessoalmente'.
"O depoente disse nessa reunião a
Eduardo Cunha que seria impossível fazer depósitos mensais; que o depoente
disse ao deputado que fariam depósitos com periodicidade irregular; que
esta impossibilidade de realizar depósitos mensais decorria da precaução que
seu pai tinha em dar as ordens bancárias para o exterior; que o pai do depoente
normalmente dava tais ordens aos gerentes das contas no exterior pessoalmente,
seja em viagens que fazia ao exterior ou, ainda, quando o gerente vinha ao
Brasil; que não sabe se seu pai enviava ordens por outro meio de comunicação à
distância, como fax ou e-mail."
O delator continuou. "A pedido do pai, o
depoente solicitou uma reunião com Eduardo Cunha por meio da secretária do
depoente; que ela, Sheila Oliveira, entrou em contato com a secretária do
presidente da Câmara e, em seguida, enviou um e-mail para o depoente,
questionando qual seria a "pauta para a reunião"; que respondeu o
e-mail afirmando que 'Ele está a par. Só avisa q sou eu'", declarou.
Segundo o delator, este e-mail é datado de 16 de agosto de 2011.
Pernambuco Júnior disse que a reunião 'foi
efetivamente marcada e realizada, não se recordando ao certo
onde'. "Neste encontro, ocorrido provavelmente entre o final de
agosto e o início de setembro, perguntou a Eduardo Cunha se haveria a
possibilidade de mudar o banco e indicar uma conta na própria Suíça; que o
deputado concordou e disse não haver problemas e que, no mesmo
ato, já indicou a conta Esteban Garcia, no banco Merryl Lynch Bank, na Suíça,
onde, a partir daí, foram realizados todos os depósitos a Cunha", declarou.
O delator narrou ainda que por uma ou duas
vezes as contas no exterior eram enviadas por Eduardo Cunha em envelopes
lacrados e sigilosos para a filial da Carioca em São Paulo, "contendo os
dados da conta e códigos de transferência". A defesa de Eduardo Cunha
foi ainda não se manifestou.|tribunadabahia