O governo cogita adotar programas de desligamento
voluntário de servidores e suspensão do aumento real do salário mínimo, como
último estágio para enfrentar o eventual descumprimento do limite de gasto na
elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA). O anúncio foi feito pelo ministro
da Fazenda, Nelson Barbosa, durante audiência pública na Comissão de Assuntos
Econômicos (CAE), nesta terça-feira (29).
Barbosa disse que está usando como referência,
nessa proposta, o que foi feito recentemente nos Estados Unidos, que
estabeleceu o acionamento de cláusulas de controle de despesas, chamadas the
sequester, ou seja, sequestro de recursos na hipótese de a despesa ou a
dívida subir muito.
A ideia do ministro é estabelecer um limite para as
despesas primárias federais como um percentual do Produto Interno Bruto (PIB)
no Plano Plurianual (PPA). Como passo seguinte, a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) deverá fixar o valor nominal do limite de gasto para cada ano,
que deverá ser observado na LOA.
De acordo com Barbosa, em caso de impossibilidade
de cumprimento do limite de gasto na elaboração da LOA, serão acionadas
automaticamente medidas de redução de despesas em três estágios. O primeiro
deles é a suspensão de aumentos reais, com a manutenção apenas de aumentos
nominais de despesa de custeio e despesa de pessoal.
Se isso não for suficiente, vai-se para um segundo
estágio, com a suspensão dos aumentos nominais de despesas de pessoal e de
despesas discricionárias. Se isso for insuficiente, passa-se ao último estágio,
com corte de benefícios para servidores, programas de licença voluntária ou,
eventualmente, de desligamento voluntário de funcionários públicos, "onde
isso for possível".
Outra medida nesse último estágio é a suspensão
temporária do aumento real de salário mínimo, mantendo-se a correção apenas
pela inflação. A Lei 13.152/2015 aplica ao salário
mínimo, anualmente, até 2019, o reajuste pelo Índice Nacional de Preço ao
Consumidor (INPC) e o aumento real com base na taxa de crescimento do PIB.
Credibilidade
Primeiro senador a interpelar o ministro, Ricardo
Ferraço (PSDB-ES) classificou Barbosa como "protagonista da tragédia
econômica" vivida pelo Brasil, já que integrou os dois governos de Luiz
Inácio Lula da Silva e as duas gestões da presidente Dilma Rousseff. Colocação
semelhante foi feita também pelo senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO). Ferraço
questionou a credibilidade do governo para implementar o programa de
reequilíbrio fiscal previsto no Projeto de Lei Complementar257/2015, enviado pelo Executivo à Câmara
dos Deputados.
O ministro da Fazenda respondeu que as ideias
contidas no programa não são uma repetição do passado, em que as alterações nas
metas fiscais são realizadas no fim do ano. Dessa vez, conforme Barbosa, há uma
combinação de medidas de estabilização no curto prazo com regras de maior
controle do gasto público no médio e longo prazos.
Para 2016, o governo espera uma "frustração de
receitas" de R$ 82 bilhões, devido à queda de arrecadação e de dividendos.
Para evitar um corte excessivo, que derrubaria ainda mais a economia, na
avaliação do ministro, o governo propôs a redução da meta fiscal de um
superávit de R$ 24 bilhões para um déficit de R$ 96,6 bilhões.
Só assim, no entendimento de Barbosa, poderão ser
mantidos programas essenciais, em saúde, defesa e investimento (conclusão de
obras em andamento), além da regularização do Auxílio Financeiro para Fomento
das Exportações (FEX), recursos entregues aos estados para compensar as
desonerações dos produtos exportados.
Despesa
O ministro disse que, no médio e longo prazos,
deverá ser enfrentado o problema da composição da despesa primária. De acordo
com o Orçamento de 2016, apenas 8,3% dessas despesas estão na categoria de
discricionárias, em que o governo tem maior liberdade para gastar e efetuar
cortes (contingenciamentos). A previdência e assistência social, não passíveis
de corte, são responsáveis por 44,9% da despesa primária. A fatia com o
pagamento do pessoal inativo da União é de 10,3%.
O fato levou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) a
perguntar como reverter as expectativas na economia sem uma reforma na
previdência, que, conforme o parlamentar, não tem apoio do partido de
sustentação do governo, o PT. O ministro disse que existe uma discussão em
andamento sobre o assunto e que "há várias maneiras de promover uma
adequação da previdência ao envelhecimento da população".
— Esse é um desafio para a geração atual do Brasil.
A previdência é um tema a ser enfrentado por toda e qualquer democracia – não é
só o Brasil – neste século. Todos os países do mundo estão tendo que adequar
seu regime de previdência e não somos diferentes. Estamos procurando fazer isso
de uma forma antecipada e de forma previsível, sem também querer ser o dono da
verdade, porque há várias formas de fazer isso. Portanto, estamos avaliando
como foi feito no mundo, principalmente ouvindo as opiniões dos principais
interessados — afirmou o ministro.
Repatriação
Em resposta aos senadores Humberto Costa (PT-PE) e
Dalírio Beber (PSDB-SC), Barbosa anunciou que há uma expectativa de arrecadação
de R$ 35 bilhões com aplicação das regras do Regime Especial de Regularização
Cambial e Tributária (repatriação de recursos não declarados) previstas na Lei 13.254/2016.
A senadora Marta Suplicy (PMDB-SP) fez críticas à
postura da Receita Federal quanto ao Projeto de Lei da Câmara (PLC)125/2015, que evita o que os
especialistas chamam de "tranco tributário" quando uma empresa passa
de uma faixa para outra no Simples Nacional. Barbosa disse que apoia a
"passagem" suave de uma faixa para outra, mas que isso tem de ser
feito com o mínimo de perda para a arrecadação.
Um dos pontos abordados pelo ministro foi a
proposta de alongamento do prazo de pagamento da dívida dos estados com a União
em 20 anos. O senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) disse que muitos estados não
concordam com as condições impostas para a renegociação, como a proibição de
novos incentivos fiscais e de concessão de reajustes para servidores. Barbosa
assegurou que a proposta foi discutida com os secretários de Fazenda e obteve o
apoio da maioria deles.
A audiência, que durou quatro horas, foi presidida
pela senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e contou com a participação da população
pelo portal e-Cidadania.